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    Crónica de Évora - Se não fosses tu, António...


    Se não fosses tu, António, não teria título para esta crónica. 
    Se não fosses tu, António, aposto que adormecia naquele fantástico lugar que me foi outorgado... Pena ter ali a banda ao lado para despertar a qualquer momento.
    Se não fosses tu, António, estava a lixar-me e fazia aqui dois rabiscos sem importância, tal como o fantástico (já tinha dito fantástico? e fabuloso?) lugar me foi posto à disposição.
    Se não fosses tu, António, a união e prestação de enorme qualidade do teu grupo, estaria sem ideias e sem pensar no que iria escrever. Mas não sou de esperar, deixar para mais logo ou para amanhã... Vivo do presente. E vivi e presenciei muitas vezes o teu ciclo e foste grande entre os grandes.
    Se não fosses tu, António, dois ferros e um ambiente grande (embora o alvoroço poucas vezes tivesse justificação)...

    Saiu o segundo Passanha, com 522Kg, suavón, a deixar-se levar mas sem empregar-se, a menos e rachado. Pablo andou  por ali e nem dei por isso... Aliás, dei porque tal como a sua segunda prestação, houve exagero em prolongar lide, quando não havia nada a justificá-lo.
     Temple, suavidade, os cavalos parece que levitam, mas... zero emoção. Os compridos foram os com melhor desenho, altura em que o oponente ostentara melhor condição. Correcto em busca dos embroques, mas a pecar pela colocação da ferragem, que resultou dispersa. Partiu mais do que uma vez descentralizado e cravou praticamente em ladeio,  algo ventajista e sem o selo do Pablo habitual. Mas a história do segundo Passanha da noite escreveu-se com pena d' oiro, quando a banda parou e o cornetim tocou para a pega. Olhei para a trincheira, e entre as dezenas de forcados eborenses, logo surgiu António Alfacinha. Estava na hora, chegara o seu adeus. Confesso que não vi o brinde, e estaria ainda a rabiscar sobre o que havia visto. A praça ergueu-se e ovacionou com importância, com a mesma que o António merece e denotou ostentar durante estes últimos anos. O cite foi António Alfacinha, calmo, sério, senhor e forcado. O Passanha saía a qualquer altura, e o António mandou-o vir quando quis, alegrou uma investida que vinha amorfa, recuou o suficiente e reuniu a preceito e com correção. O grupo esteve à altura, e o momento foi bonito. Mas depois de duas voltas à arena (e toda a praça em pé), surge João Pedro Oliveira em praça. Estavam só os dois, António e João, e o mais velho chorava, e provava a todos que os homens também choram, e os grandes e eleitos também têm direito a fazê-lo. Momento carregado de emoção e simbolismo. Foi uma despedida bonita, simples, mas com um grande poder. Se não fosses tu, António, não teria título para esta crónica, nem teria visto tanto momento importante que imortalizaste na cara de um toiro. Obrigado.

    Noite de Glória para os Amadores de Évora...

    Abriu praça o jovem João Madeira. Não foram impostas quaisquer dificuldades pelo toiro, nem o forcado complicou, estando bem na primeira tentativa, tal como o grupo a ajudar, numa mescla entre forcados retirados, antigos e actuais. 
    O terceiro da noite tinha poder, pouca raça, mas força e podia complicar. João Pedro Oliveira, forcado tecnicamente reconhecido, esteve soberbo. O toiro saiu solto e com mais pata que os irmãos, a reunião foi dura, mas depois, alarde de técnica, de cumprimento das regras que ditam a arte de pegar toiros. O toiro empurrou e aguentou-se firme e com uma enganadora facilidade aos olhos de menos entendidos. A chegar a tábuas o animal tentou fugir ao grupo, mas este respondeu bem. João será o encarregue de dar continuidade à missão de António, que creio estar bem entregue... Sorte.
    O quarto coube a Gonçalo Pires, e a brusquidão do primeiro derrote foi de arrepiar. O forcado, praticamente sem recuar, adiantou-se ligeiramente à investida do toiro e este derrotou com impacto e brutalidade. No segundo intento emendou-se, e apesar de não ter recuado muito (q.b. apenas), sentou-se na cadeira e fechou-se muito bem, vindo toda a viagem acoplado e bem acomodado na cara do Passanha.
    Manuel Rovisco partiu com muita decisão, e um cite mais atabalhoado, para enfrentar o quinto. O toiro partiu com convicção e investiu pouco franco, tendo o forcado reunido com pouca ortodoxia mas com valor, aguentando-se com poder na cara do toiro, que despejou dois ou três derrotes mais desconcertantes mas que foram bem suplantados. Grupo ajudou como tinha de ser e pega à primeira.
    Francisco Garcia Chico Tadeu, glória retirada dos Amadores de Évora, é um dos forcados que melhores momentos me proporcionou em praça, com um percurso completamente exitoso e de muito mérito. O sexto foi chato, nunca quis ceder a sua conduta, de manso e cobarde, e custou a sair. De vários terrenos foi citado, e a primeira vez que saiu foi de forma sonsa e sem franqueza. O torniquete resultou o suficiente para retirar o forcado da cara e sair por baixo. Na segunda tentativa, mantendo o cite que marca os forcados de classe e com importância, mandou-o vir com ganas e ele veio descaindo e perdendo terreno ao grupo, mas o Chico não se fez rogado e esteve superior, muito bem a reunir e a aguentar bem fechado até o grupo chegar. 
    Foi uma noite bonita, de triunfo, nostálgica e muito sentida. Novos e velhos, antigos e actuais, elevando os pregaminhos pelos quais se deve reger um Grupo de Forcados. O único grande triunfo da noite. 

    Da Pina vieram a Évora seis Passanha de exemplar presença, corrida bonita, parelha, bem feita, bem cuidada e sem exageros. O primeiro foi nobre e voluntarioso, o segundo fácil e rachado, o terceiro com matizes interessantes ainda que sem casta, o quarto manso (concedida volta...), o quinto sem fundo e a aborrecer-se e o sexto disperso e com pouca vontade. 

    João Moura andou aliviado com o primeiro da noite. Era para estar a gosto o toiro de Passanha, obediente e sem exigir, pedia apenas vontade e boas maneiras por diante, algo que Moura nem sempre lhe soube facultar. Nos compridos andou com desenvoltura, e nos curtos não houve transcendência, com mais desacerto do que ajuste. 
    O quarto mostrou estar disponível de início, mas rachou-se praticamente após os compridos, e poucas vezes saiu do tercio. Toiro de frente para a crença natural, quase em tábuas, nos três primeiros curtos; e os últimos dois na diagonal dos anteriores. 
    O Passanha perdeu depressa o interesse, e de Moura não houve lide para mexer-lhe e contrariá-lo, mas houve inteligência para aproveitar o pouco que ele tinha. Arrancando com a montada de largo, o toiro só se motivava com o cavalo a três metros, Moura falava-lhe durante a viagem para lhe manter a atenção e quando carregava o toiro já estava com ele. Os dois primeiros curtos foram como prova, e o teste parecia ainda não lograr boa nota, mas o terceiro curto... Curiosamente o toiro agigantou-se, Moura fez uma batida sem qualquer pronúncio e o cavalo escapa rápido ao toiro, com  Niño Moura a parar o tempo e a imortalizar o toureio naquele momento. De alto a baixo, cingidíssimo, puro. A praça veio a baixo. Que saudades destes tempos, destes ferros, do João Moura de Madrid, do João Moura de Évora... Os dois outros curtos com culminou a prestação voltaram a ter sequência e intenção, mas inferiores ao hino que se fez no terceiro. 

    Pablo Hermoso de Mendoza detém um estatuto que é reconhecível e praticamente inalcançável para a maioria. 
    Contada já a história do segundo, no quinto houve apenas e só mais conexão com a bancada, por que o resto... Nulidade de emoção, sem chispa. 
    O Passanha não tinha codícia, foi nobre e era bem agradecido a tratamentos como o de Pablo, pedindo-lhe pouco ou nada até que ele se aborrecera. 
    Tudo é muito hermoso e belo, mas faltou tudo o que é essencial nesta noite. Os compridos mais exequíveis, e dos curtos, só o terceiro entusiasmou, com o Disparate, que ainda assim, pouco acrescentou. As piruetas tiveram maior eco no tendido, e de novo pecou por uma lide excessivamente extensa, e pior é quando o conteúdo não o justifica. Se andou correctinho? Sim... Vulgar? Vulgaríssimo... 

    João Ribeiro Telles teve noite a quente e frio. 
    O terceiro Passanha da noite foi o mais importante do curro. Não se limitava a passar ou perseguir, quis por vezes acometer e com qualidade, teve momentos no capote que raramente vi a um toiro desta divisa, em especial quando foi colocado para a pega: cara no chão, seguiu o voo fixo e planando a investida, chegando a rebosar no capote. Faltou raça e que tivesse durado um pouco mais... 
    João R. Telles não esteve decidido o suficiente para poder demarcar-se dos seus alternantes. Preocupou-se em dar-lhe lide e extrair o que podia, mas quase sempre fiquei com a sensação que faltou algo no momento do ferro.
    A brega foi medida e não exigiu nada, o toiro foi perdendo o vínculo e a ferragem da ordem limitou-se a ser cumprida sem alardes do bom toureio que pratica. Pouca história...
    O sexto foi manso, andou disperso toda a lide, sem fixação e a carecer de vontade para a luta. João não o entendeu, e até aos dois últimos curtos tocou uma balada desajeitada e de baixa qualidade. Os compridos à tira começaram a apontar os primeiros acordes desafinados, e a falta de entendimento com o oponente estava gradualmente a tornar-se cada vez mais leviana e desajustada. Procurou a câmbio dar sentido à partitura, mas o toiro fora das sortes qual acorde fora de tempo deu-me vontade de sentar-me no meu fantástico(!) lugar. Mas numa altura em que o som já era estridente, mudou a montada, veio com a disposição que não tinha visto, partiu com tudo para o toiro e cravou um ferro sentido e que saiu como um maestro a partir a batuta e ordenar que tudo parasse. Galvanizou-se, viu o que tinha e os recursos a que nos habituara para poder mudar o fecho. Trata-se de um posto, do futuro, do nosso futuro, e os ferros devem ser todos encarados assim, os compromissos devem ser isto... Ou que rumo teremos? 
    O último curto foi o melhor, cresceu o dobro, e porque acredito em empatia, o cavalo sentiu e com ele cresceu também mais um pouco, para cobrar um ferro importante, nos centro da arena(L), a distância curta e com casta e entrega, o que afinal de contas, é e sempre será o sinónimo de emoção.

    Évora esgotou o seu aforo, a Catedral do Forcado estava bonita de verdade, ambiente enorme, por vezes efusivo  e sem justificação, mas provando que há fórmulas, datas e praças que podem resultar para que nos possamos regozijar perante os que anseiam a nossa queda. Évora teve duas praças cheias em menos de um mês, uma das quais esgotada horas antes e ainda assim com muita procura de qualquer entrada até ao seu início. 

    Dirigiu o Sr. Agostinho Borges, mal na minha opinião na concessão da volta ao quarto toiro. A Banda de Alcochete abrilhantou o espectáculo com a habitual qualidade. 

    Pedro Guerreiro