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    Crónica de São Manços - 'Glória a ti, que ainda és o Rei da Festa...!'


    Em São Manços respira-se afición aquando da realização das suas tradicionais Festas de verão. Ambiente invejável para muitas praças de categoria superior, cuidada e preparada ao pormenor, a 'José Jacinto Branco' viu as suas bancadas preenchidas em 3/4 arrobados.

    É inevitável frisar que os tempos mudaram. Que hoje vislumbramos uma festa com um sentido muito mais populista, que critérios (e tanta gente que desconhece o que é ser criterioso) como a seriedade, a verdade e o carácter, se vão esfumando de forma acentuada, de forma preocupante. 
    Das imposições aos favores, das trocas aos troféus no final da temporada. 
    Realmente alarmante, num seio completamente mermado, é a amnésia aguda que se tem verificado para com quem deve (ou devia) ser elevado com justiça. Sem rodeios: O Toiro. 

    O Toiro (Toiro!), é, quer queiram fazer parecer o contrário, quer não queiram, o Rei da Festa. Não será à toa (depende do ponto de vista, ou do que querem ver), que a Festa ainda tem o apodo dos Toiros, e que por muito que tentem repristinar, o Toiro encarrega-se de ditar lugar e posições, e no pódium só se mantém quem respeitá-lo, e puder com ele. 

    O curro de Veiga Teixeira que saiu à pequena praça de São Manços, homogéneo e cumpridor no que respeita a apresentação, revelou um exponencial importante nos trâmites essenciais do conceito de bravura. Desenrolou matizes diversificadas, mas convém dar um plus à casta e poder que se verificaram como aspectos dominantes. O segundo foi móvel e pronto; o terceiro codicioso e a transmitir; o quarto foi bravo, de verdade, fiero, encastado e a transmitir.
    Já se havia verificado em Lisboa, e ontem ficou de novo patente em São Manços: quando sai o Toiro (Toiro!), a festa adquire a dimensão, o riesgo e a emoção que fazem dela a mais apaixonante, verdadeira e sincera Arte.

    Luís Rouxinol é um toureiro que não precisa provar nada. A carreira e todo o glorioso percurso falam por si. Foi vencedor do troféu para a melhor lide que estava em disputa, e que segundo os jurados, foi atribuído pela sua prestação no quarto toiro, o que, na minha ótica, é totalmente discutível.
    O Luís Rouxinol toureiro, sério e com argumentos para aguentar o bravo, e fazer recriar o manso, viu-se no primeiro toiro da noite. O Teixeira, com 570Kg, saiu raspando, mirando o tendido e a teia (que se encontrava excessivamente lotada e com muita mexida), rebrincado, doeu-se algumas vezes e requeria sapiência e ligação. A sua conduta de manso despertou o lado aguerrido de Rouxinol, que o entendeu com as lacunas e dele exprimiu o pouco conteúdo que tinha. A ligação e constante provocação nos terrenos certos (os que só pisam aqueles que aguentam), despertaram um encastado sentido, e o primeiro curto a sesgo foi de lei, e o quarto de muito mérito, com destaque para a boa capacidade do cavalo 'Átila'. Se havia lide merecedora de prémio... 
    O quarto, também ele proveniente da Herdade do Pedrógão, com 600Kg, comprido e musculado, de córnea baixel, revelou fundo de início no capote, investindo com classe e humilhando com recorrido. A fase inicial da lide não resultou transcendente, subindo ligeiramente de tom nos curtos. O Teixeira, com fijeza e prontidão, duro e com muito que tourear (Bravo, com tudo o que implica a bravura), fez suar Rouxinol e 'Viajante', que lograram o melhor ferro da noite. O primeiro curto, aguentado e esperando a investida do toiro não resultou eficaz, com a batida a descompor a investida do animal e a tirar brilho a sorte, situação repetida sempre que o toureiro optara por encarar o toiro desta maneira. Na brega a égua fez gala das suas capacidades, e apenas o segundo curto fica na retina. O toiro veio com ímpeto, cavaleiro e montada aguentaram e a escassos metros de distância partiram para um embroque cingido e emotivo. Terminou com um palmo e par montando o 'Antoñete'. Quando sai o Toiro (Toiro!), a emoção e o sabor são, obviamente, distintos. A ele deve ser feita glória, pois a festa é e continuará a ser dele.


    Marcos Bastinhas não logrou inspiração na calorosa noite alentejana. Transpareceu um ar frágil e algo apático (uma total antítese do que é na verdade Marcos), e apenas no final da lide do quinto revelou maior entrega e disposição.
    O Veiga Teixeira que foi segundo lugar era toiro para triunfo. Com mobilidade e tranco, faltando um pellín de transmissão, saiu de largo quando quis mas não encontrou vontade da parte do toureiro. Desenhou corretamente as sortes e preocupou-se em lidar o toiro, faltando chispa e por vezes acerto no momento da cravagem.
    O quinto, com 520Kg, harmonioso e bem posto de cara,  encastado, algo reservón de início, teve o condão de ir a mais. Os compridos não foram exequíveis, e nos curtos, sempre que procurou o toureio a câmbio raramente logrou um embroque cingido. Terminou melhor, nitidamente mais disposto e com um bom par que agradou ao conclave.



    O jovem colombiano Jacobo Botero denotou ganas e uma vontade de salutar, ainda que para aliar isso de forma contundente ao seu toureio, necessite de cuajo e de assento.
    O primeiro Teixeira que teve pela frente, alto e comprido, com 610Kg, negro mulato listón, algo guasón e com poder, nunca revelou franqueza e um comportamento estável.
    Jacobo procurou impactar com a brega, e na ferragem consentiu demasiado a investida do toiro, sofrendo toques em demasia, logrando contundo um bom ferro (terceiro da ordem).
    O último, também ele com caixa e trapio, 590Kg, não revelou condições profícuas a brilhantismo. Andarilho e com pouco motor, não foi tarefa fácil para Botero, que procurou acerto e dinâmica, mas nem sempre foi ortodoxo e convicente. Bom curto o quarto, cingido e com som, após ter sofrido um toque violento junto a tábuas. Terminou com palmos em violino, que agradaram o público de São Manços.


    São Manços viu mais um ano o tradicional confronto entre Santarém e São Manços, numa noite com emoção (q.b) no que respeita às jaquetas de ramagens. 

    A formação scalabitana superior-se à jaqueta da casa, com duas pegas à primeira e uma à segunda.
    Salvador de Almeida esteve correctíssimo no primeiro, com um cite sereno (e de frisar o silêncio que se fez na realização das pegas), mandando no toiro e fechando-se com decisão, com uma oportuna e grande primeira ajuda; Luís Seabra pegou o terceiro com facilidade e mérito à primeira, com o grupo coeso e exemplar a ajudar; Hugo Santana esteve decidido com o quinto, que na primeira tentativa rodou e fugiu ao grupo, tendo desfeiteado a tentativa. À segunda, e com a mesma intenção, o forcado fechou-se firme e o grupo foi pronto a responder.

    Em casa e com o seu público, os Amadores de São Manços concretizaram as sortes à primeira, quinta e segunda tentativas.
    Jorge Valadas esteve bem com o segundo da noite, carregando firme e fechando-se muito bem no primeiro encontro, em que o grupo foi crucial; O quarto Teixeira foi pegado por Pedro Galhardo à quinta, denotando-se alguma lacunas nas ajudas nas primeiras tentativas. A sesgo e com o grupo em cima conseguiu consumar; Pedro Fonseca pegou o último à segunda tentativa, a reunir sem correção mas com braços para aguentar a viagem.

    O espectáculo, que decorreu num timing exemplar, foi dirigido por Agostinho Borges e abrilhantado pela Banda Filarmónica de Nossa Senhora de Machede, que no final estreou um pasodoble intitulado de 'Forcado de São Manços', em tributo à jaqueta da terra.

    Em suma: nunca se deve esquecer (ou querer que se esqueça), que o Toiro (Toiro!), é e sempre será o Rei deste meio, que curiosamente se chama... Festa dos Toiros!


    Pedro Guerreiro