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    Nem tudo o que parece é! Campo Pequeno, 20 de Maio, 2010

    LISBOA-Crónica de nuestra subdirectora, PATRICIA SARDINHA (NATURALES, Correio da Tauromaquia Ibérica)
    Já ninguém tem dúvidas, Portugal está absorvido numa crise económica, que para mim é apenas mais uma entre outras carências de que o povo português padece. A crise não é só monetária, é também de valores, de patriotismo. Existe grande desapego da terra e das tradições e muitos falam em nome de uma evolução, da era moderna, que a meu ver me parece mais um retrocesso. A tauromaquia não está imune e tem vindo ao longo dos tempos a ver aumentar as suas privações. Não bastando os ataques daqueles que se dizem anti-tourada, é de dentro da Festa que surgem os maiores espinhos para quem é aficionado, com toiros que ao longo dos anos decrescem em bravura, toureiros cujo ofício não prima pela qualidade e um público que desacreditou na emoção (e no preço dos bilhetes) das corridas e por isso não aparece, ou quando aparece é para revelar o seu pouco sentido do que é o toureio e faz uma festa por tudo e por nada que se mexa na arena.
    Uma das maiores dores que tenho enquanto aficionada é o estado em que se encontra o nosso toureio a pé. Os toureiros não se arrimam, não criam competição, faltam-lhes oportunidades, os empresários não montam cartéis com novilheiros/matadores porque dizem eles que isso não lhes rende e que o público não gosta. Mas como se pode gostar daquilo que não se tem? É por isso que fico contente quando vejo ser apresentada uma novilhada ou uma corrida mista, principalmente se envolver toureiros lusos e acredito que isso por vezes possa implicar prejuízo para as empresas porque realmente o público português desaprendeu o toureio a pé. E o Campo Pequeno correu esse risco ao montar uma corrida mista, com um matador português e uma figura espanhola e para mais televisionada.
    Se correu bem ou mal em termos ‘empresariais’ não faço ideia, mas que a casa estava composta com cerca de ¾ de lotação preenchida, isso estava. Mas o que mais me agradou foi ver as bancadas reagirem ao toureio a pé, sinal de que afinal o público gosta desta vertente do toureio. O público vibra com o movimento do toureio a pé, independentemente de ser perfeito ou não, mas reage e isso para mim já é meio caminho andado para o restabelecimento do toureio a pé em Portugal.
    Em termos artísticos pouco haverá por dizer, pois tendo a corrida sido transmitida pela televisão, cada um tirou as suas ilações. Mas sabendo que por vezes, nem tudo aquilo que a caixinha mágica transmite (ou quer parecer transmitir), corresponde em 100% à realidade daquilo que se vive em praça, vale a pena deixar o meu pouco entendimento do que se viveu no Campo Pequeno a 20 de Maio.
    O toiro que abriu a noite da ganadaria de Ortigão Costa, pesou 550 kg e vinha inferiorizado das patas traseiras, talvez pelo tempo que passam os animais enjaulados no camião até chegarem à praça, ou devido a algum percalço já nos curros. A verdade é que deveria ter sido devolvido e trocado pelo sobrero, mas assim não o entendeu o director de corrida, o que é de criticar pois estamos na principal praça do país, onde a qualidade do espectáculo deveria ser palavra de ordem. E como se não bastasse a condição da rês, ainda teve que servir para uma lide a duo e este tipo de actuação geralmente não adiciona nada ao espectáculo, pelo contrário. Não fosse algum labor de Luís Rouxinol e da primeira actuação pouco ou nada haveria para reter.
    Em solitário, Luís Rouxinol teve pela frente outro Ortigão Costa, com 518 kg. Regular na ferragem comprida, nos curtos a actuação foi crescendo de tom, com o cavaleiro a entusiasmar as bancadas com o típico das suas actuações, ferros violino, o par e os adornos.
    Já Rui Fernandes pouco entusiasmou. Frente a outro Ortigão, com 545 kg, que foi subaproveitado pelo cavaleiro que cometeu por demais passagens e ferros passados, tendo ainda sofrido valente toque na montada.
    Os Forcados Amadores da Chamusca também não tiveram noite fácil. Rui Pedro só consumou ao quarto intento, depois de tentativas anteriores com o toiro a derrotar muito e com as ajuda a faltar. Emanuel Injay efectuou uma grande pega, aguentando praticamente sozinho a investida do toiro, tendo sido o momento alto da noite. Podia inclusive ter-se aberto pela primeira vez a Porta Grande a um forcado, mesmo que a sua pega não fosse assim tão meritória de tal feito, mas se a Porta já se abriu outras vezes noutras temporadas para cavaleiros que não o mereciam, porque não também para um forcado? O forcado deu duas voltas (na segunda com Rouxinol à pendura), faltando só a terceira, talvez porque a humildade do forcado, ou o seu desconhecimento do regulamento da praça, não o permitiram. Pegou ainda Diogo Cruz à segunda tentativa, com o primeiro ajuda a ser fundamental.
    No que toca à parte a pé, Luís Vital ‘Procuna’ teve a sorte grande. Não só porque toureava na principal praça do país, ao lado de uma das maiores figuras espanholas e numa corrida televisionada, como ainda por cima com o lote que lhe tocou, dois toiros que se deixaram lidar. No seu primeiro toiro, um Varela Crujo com 508 kg, e de capote na mão, começou por efectuar navarras rematadas com uma serpentina, mas foi no tércio de bandarilhas que mais entusiasmou as bancadas. Já na muleta o matador português perde poder. Levando muito a rês para fora, sem ligação nos passes e alguns enganchões pelo meio. Ainda assim o público esteve com ele. O seu segundo toiro, com 502 kg, foi recebido de joelhos com o capote onde voltou a demonstrar disposição e variedade. Repetiu a proeza de se exibir nas bandarilhas levantando o público das bancadas para o aplaudir. Na muleta o mesmo credo de sempre, levando o toiro para fora, tirando-lhe cedo a flanela, mas aproveitando algum partido do bom piton esquerdo da rês. O público correspondeu sempre ao matador português.
    Miguel Ángel Perera tem outro valor e outro toureio. Frente ao primeiro do seu lote, um Varela Crujo com 505 kg, justo de forças, Perera andou discreto de capote, mas na muleta o temple do seu ofício fez-se sentir. Tem a calma nas mãos e foi lentamente, em cada passe, sacando do toiro o que este tinha e não tinha. No segundo toiro, de 541 kg, com génio e brusco. Perera voltou a demonstrar arte na muleta, com um toureio profundo, estando por cima da rês que lhe tocou.
    Dirigiu a corrida com alguma benevolência, o Sr. António dos Santos, assessorado pelo veterinário Salter Cid. Não tendo sido uma noite perfeita em termos artísticos e apesar da extensa duração, pois sete toiros a isso implica, a corrida decorreu em bom ambiente, para o qual também contribuiu o muito calor que se fez sentir.