Feira de Abril 2017: Pode mais quem quer do que quem pode...
Findou ontem, com a tradicional Miurada, a Feria de Abril de Sevilla.
Este ano, com maior extensão de festejos durante o mês de maio, foram vários os festejos que agregaram motivos de interesse para atrair público e a afición de Sevilha.
Numericamente falando:
11 Corridas de Toiros - 3 corridas esgotadas; 5 corridas com 3/4 ou mais; 2 corridas com cerca de meia praça - 2/3.
1 Corrida de Rejoneio - 3/4 de entrada.
Lidaram-se 72 toiros (Um bis na corrida de El Pilar e outro na de Victoriano del Río): Lograram-se 15 orelhas, sendo que apenas uma faena obteve dois troféus como prémio. Um toiro foi premiado com a volta ao ruedo.
José Garrido - Orelha; El Juli - Orelha; José María Manzanares - Orelha e Orelha; Antonio Ferrera - Orelha; Paco Ureña - Orelha; Sergio Galán - Orelha; Diego Ventura - Orelha; Francisco Rivera - Orelha; Cayetano - Orelha; Alejandro Talavante - Orelha; Roca Rey - Duas orelhas; Pepe Moral - Orelha e Orelha.
Pisaram o albero da Maestranza 25 Matadores de Toiros (8 actuaram mais que uma vez) e 3 rejoneadores, bem como 12 divisas distintas.
A Puerta del Príncipe manteve-se fechada, numa feira de aromas com várias essências mas marcada por quem mais quer do que por quem mais pode...
Sem novidades ou surpresas aquando do seu anúncio, o naipe ganadero para o abono 2017 em Sevilha pouco interesse suscitava.
Várias corridas não resultaram em 2016, outras desde muito antes não vêm resultando, mas repetiam-se na presente temporada...
O fenótipo e o tipo de toiro que encaixa em Sevilha foi mais desvirtuado que nunca.
Contrariamente ao esperado, houve imposição dos toiros sobre os toureiros, numa Feira que podia ter acabado com outros número e outra glória. Houve tendência para orejitas baratas, com toiros de rabo e conteúdo suficiente para ambicionar ver o Guadalquivir a ombros.
Torrestrella, Victorino Martín, Jandilla e Miura merecem destaque no que requer a homogeneidade e idiossincrasia, pela maior percentagem qualitativa verificada nas tardes em que lidaram.
Individualmente, vários toiros merecem destaque. Muitos foram azarados na hora do sorteio, outros não encontraram resposta por parte dos seus lidadores e outros não romperam com tudo por falta de argumentos por diante. De Torrestrella, Ruidoso (Garrido cortou orelha); De Victorino Martín Platino (Ferrera cortou uma orelha); De Jandilla Caudillo e Ilusión; De Juan Pedro Melodía; De Núñez del Cuvillo Novelero; De Victoriano del Río Derramado (volta ao ruedo); De El Pilar Bellito; De Miura Amapolo (Pepe Moral cortou orelha).
Mais picotazos que puyazos, menos exigência e maior benevolência. Por falta de toiros com possibilidades não podem (nem devem) queixar-se os intervenientes.
E se já não vão podendo com estes... (!?)
Como disse Juan Belmonte 'Se torea como se es...' e a Feira que protagonizou Antonio Ferrera não podia ser mais reveladora do célebre dito do histórico toureiro Sevilhano.
Duas versões de um toureiro que regressou maduro, com um barroquismo e toreria genial.
Na tarde dos Victorinos, sapiência e labor de toureiro curtido, de toureiro capaz de se agigantar aos mais complicados reptos e sacar a alma de um bárbaro para deleitar quem entendeu a sinfonia.
A fiereza de Platino foi suplantada pelo fiero Ferrera.
A corrida de El Pilar voltou a provar que é completamente desnecessária em Sevilha. Corrida amorfa, desprovida de condições e de sobra por limitada. Ainda saiu Bellito, toiro de uma bondade e classe enorme, pronto e fixo, mas com falta de raça e transmissão... Teve azar Bellito. Mas isso pouco interessa, porque Ferrera fundiu em si todos os conceitos do toureio. Fundiu em si o toureio.
Teve na ponta dos dedos o mais harmónico e espectacular toureio de capote de todo o ciclo. Verónicas de uma expressão inigualável, totalmente entregue e abandonado, para sacar medias que rugiram com força para abanar a ponte de Triana.
Com a muleta esteve soberbo, com uma naturalidade e suavidade deslumbrantes, mas fazendo tudo com sentido, potenciado aos poucos o que o toiro não tinha, e apaixonando aqueles que pensavam ver obra fácil.
Antonio Ferrera é o nome que deve evidenciar-se como o mais destacado da Feria de Abril 2017.
Andrés Roca Rey quer ser de Sevilha, e sinceramente, creio que com o tempo o logrará...
A sua faena, a única de duas orelhas em todo o certame, a um sobrero de Victoriano del Río, foi inteligente e com a transmissão suficiente para a dimensão do prémio. Faltou uma tanda mais, como a melhor que potenciou pelo lado direito: colocação, mão escandalosamente baixa, investida toureada, profunda, templada, com hondura. Perde-se ainda em detalhes e apuntes, que têm a sua piada num pueblo, mas Sevilha pede toureio. Mantém a ilusão.
Uma perfumada essência pairou (como é hábito) em terras de andalucía...
Toureio caro a conta-gotas, trapazos em demasia e alguns sabores susceptíveis a poucos paladares.
Tal como em 2016, a aposta rotunda estava centrada em Morante de la Puebla. Campanha máxima ao toureiro de Puebla del Río, com quatro tardes (uma em ressurreição).
Aqui e ali, sem o brilho costumeiro, lá pintou uma tela, numa feira que pouca memória deixará. Ora bafejado pelo azar, ora pela pouca disposição, Morante não foi consistente nem inédito como de costume.
José María Manzanares, apático em demasia, podia ter transcendido a outro nível na tarde de 29 de abril, deixando (e deixará marcado nas páginas do toureio) um legado de cátedra e de um poder inigualável na sorte suprema.
El Juli, mais ventajista que o costume, cortou uma orelha à base de técnica e poder, numa faena para rever mais que uma vez e analisar a forma como Julián potenciou o animal. Esteve como nunca o tinha visto com o capote nessa tarde.
Alejandro Talavante cortou uma orelha na corrida de cuvillo, bordando três dos melhores naturales que se viram no coso del baratillo.
A Ureña não lhe vi faena para merecer prémio; Escribano não passou de voluntarioso; Padilla esforçado, mas com as carências habituais; Um Fandi renovado e que nunca tinha visto (se manter o nível só terá a ganhar); Lorenzo e Ginés Marín estiveram dispostos, mas continua a haver caminho longo pela frente; David Mora nunca passou clareza nas suas abordagens, ora puro e sentido, ora desacertado e sem selo; Francisco Rivera despediu-se numa tarde de um triunfalismo viral, valendo-lhe o carinho (do mais leviano até este ano registado) do público maestrante, enquanto Cayetano com um sentido de temple em eminente cuajo logrou momentos de nível; Perera, Jimenéz, Nazaré e Esaú andaram dispostos e com desenvoltura, mas sem sequência. López Simón voltou a mostrar o que é ser um pegapases, sem intuição nem ligação, em actuações paupérrimas.
José Garrido está cá para lutar pelos postos de cima. Tem um cunho pessoal muito próprio, maneiras e sentido de toureiro de arte. Esteve em grande plano na corrida de Torrestrella.
Pepe Moral é um toureiro de enorme valor. Mas Pepe Moral é também um toureiro prodigioso, que toureia bem, de verdade, com nexo, com sentimento. O que fez diante de dois Miuras ganha contornos especiais dada a sua dimensão. Toureio caríssimo, do de ontem, hoje e sempre. Atenção no tratamento deste toureiro.
Galán cortou uma orelha na de rejoneio mas Ventura levou vantagem. Muitas críticas surgiram em relação à corrida de Bohórquez, mas analise-se tudo o que lida em torno do rejoneio... tirem as conclusões que quiserem!
A temporada segue em Sevilha, e que o tom vá paulatinamente subindo em relação ao desta feira...