Crónica de Coruche: "Quando há Vontade…"
Quando há vontade, e claro, principalmente quando há toiro, há Festa!
Alfredo Tomás e Carlos Travassos, os rostos da empresa “De Caras – Tauromaquia”, tinham tanta vontade de gerir a praça de toiros da sua terra, Coruche, que por três vezes concorreram à exploração da mesma, e à terceira foi de vez.
Ontem, sábado, tiveram a sua primeira prova de fogo. Um cartel sério, uma corrida concurso de ganadarias em que foi gerada competição pelos prémios em disputa. E se no final o festejo não foi o resultado sonhado para os empresários, pode ter andado lá perto…
Uma tarde quente e de enorme ambiente dentro de praça, que juntou assim cerca de ¾ de casa, e que se iniciou com um minuto de silêncio em memória do antigo forcado dos Amadores de Coruche, António João, recentemente falecido, e também das vítimas do atentado terrorista da última semana, seguindo-se após as cortesias uma homenagem por parte da empresa ao cavaleiro Luís Rouxinol pelos seus 30 anos de alternativa, comemorados esta temporada.
E porque do Toiro é a Festa, houve-os quase para todos os gostos mas acima de tudo, houve-os a transmitir, que é coisa que muitas vezes não vemos nas nossas corridas para bel-prazer de alguns artistas. Em Coruche as reses pediram contas, havendo uns mais reservadotes que outros é certo mas até esses a quererem toureiros pela frente.
António Ribeiro Telles jogava em casa e foi o primeiro a inaugurar a tarde frente a um toiro de S. Torcato, cumpridor de apresentação, negro listón, que tinha raça e mobilidade suficiente para proporcionar triunfo, arrancando-se várias vezes ao cite do cavaleiro. De início, o toiro foi custoso de se fixar mas soube o maestro da Torrinha encontrar-lhe sítio. Na ferragem curta, a lide veio a mais com o terceiro curto. A actuação primou pelo conceito de lide de António Telles, sabendo escolher os terrenos devidos mas ainda assim passou discreta.
O que foi quarto da ordem, um toiro de Cunhal Patrício de córnea aberta, rematado de carnes, foi reservado, bronco por vezes a perseguir aos arreões e com sentido nas tábuas, condições que António Telles fez por contrariar. Esteve por cima do oponente, cravando com acerto a ferragem da ordem montando o Alcochete mas perante um toiro de menor transmissão nas reuniões, o cavaleiro fez o que podia e fê-lo bem.
Cheio de vontade apresentou-se Luís Rouxinol em Coruche e só por isso, entendeu o público estar com ele desde o primeiro minuto. Abriu o seu turno com um bonito toiro de Canas Vigouroux que se revelou manso, de investida curta e com tendência para descair para tábuas. Rouxinol foi eficaz nos compridos para nos curtos manter sempre ligação com o toiro e contrariar-lhe a querencia. Cumpriu com a ferragem da ordem, rematando actuação com um palmito e o par de bandarilhas de agrado do conclave.
Contudo, foi frente ao quinto, um sério e bonito animal de Vale Sorraia, que Rouxinol pôs a carne no assador. No momento em que o toiro sai à arena e os peões de brega se preparavam para o parar, sem que ninguém esperasse, talvez nem o próprio, Luís Rouxinol levanta o braço, parte ao toiro e um ferro em sorte gaiola levanta o público das bancadas que logo ali lhe ficou (ainda mais) rendido. Nos curtos, foi com o Douro que manteve os aficionados presos ao seu toureio e o toiro na montada, com os ladeios ajustados a que o cavalo se permite sem que se deixe tocar. Cumpriu com a ferragem e quando julgou que poderia abandonar o tauródromo coruchense, exigiu-lhe o público mais um palmito, da mesma forma que depois lhe ordenou as duas voltas à arena.
João Salgueiro da Costa lidou como primeiro do seu lote um toiro de Pinto Barreiros bem apresentado e cumpridor em comportamento, por vezes a meter alta a cara nas reuniões. O jovem tardou em entender os terrenos do oponente para depois se evidenciar em abordagens rectas, sendo de nota positiva os dois primeiros curtos que deixou, resultando menos ajustados os seguintes. Descurou um pouco a lide, com uma actuação que chegou modesta nas bancadas.
No toiro com que encerrou corrida, Salgueiro da Costa voltou a sobressair pelas boas intenções de sortes frontais mas faltaram concretizações limpas. O toureiro entendeu dar distâncias a um toiro de Branco Núncio, que tinha raça e se adiantava uma barbaridade, o que acabou por levar a demasiados toques nas montadas após a colocação dos ferros, resultando a lide irregular e sem concessão de música e volta, agradecendo apenas do centro do ruedo.
Nas pegas houve emoção e houve homens decididos a executá-las. Pelos Amadores de Coruche pegou Paulo Oliveira bem à primeira; Rui Godinho esteve valente frente a um toiro que não baixava a cara no momento das reuniões, acabando por concretizar à terceira e com mérito também do primeiro ajuda; e Pedro Coelho a receber bem a investida alegre do toiro consumando também à primeira.
Pelos Amadores de Alcochete abriu função Diogo Timóteo consumou uma pega rija e à primeira; António José Cardoso viu o seu toiro ser tardo a arrancar-se, e quando o fez, fê-lo com violência acabando o forcado por não reunir, o que acabou por acontecer à segunda e também com eficácia do primeiro ajuda; e Gonçalo Catalão que aguentou quase sozinho a viagem até tábuas, efectivando à primeira.
Dirigiu a corrida o sr. João Cantinho, assessorado pelo médico veterinário Dr. José Luís Cruz, numa tarde onde salientamos a simpática presença dos antigos bandarilheiros irmãos António e Manuel Badajoz, a quem lhes foi dirigido simpaticamente alguns dos brindes por parte dos artistas em praça.
No final, prémios entregues à ganadaria Canas Vigouroux (Apresentação), Vale Sorraia (Bravura), Luís Rouxinol (Melhor Lide – 5º toiro), e aos Amadores de Alcochete (Melhor Grupo em Praça), todos sob aval do público, que saiu assim satisfeito e possivelmente, com vontade de regressar à Praça de Toiros de Coruche.
Por: Patrícia Sardinha