Crónica do Campo Pequeno: “Ao festejo dos 130 anos: veio o Morante e até veio um grilo ‘cantante’ “

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A Praça de Toiros do Campo Pequeno, monumento icónico da cidade de Lisboa, cumpriu ontem, 18 de Agosto, 130 anos desde a sua inauguração. Um passado já longo, marcado por muitos triunfos, alguns infortúnios, e que contou sempre com a presença nos seus festejos das máximas Figuras do Toureio mundiais mas também deu espaço aos que se iniciavam, pelo que a isso se deve a sua relevância no panorama mundial como Catedral do Toureio.

Nos últimos anos tem vivido fases mais “humildes”, em consonância com o estado da própria Festa e daqueles que dela fazem “uso”, contudo ainda mantém esse estatuto de primeira praça do país e oxalá que, por pelo menos mais 130 anos, assim se possa manter. 

Ontem, e apesar dos nossos governantes continuarem a usar antolhos no que ao Campo Pequeno diz respeito, e em concreto, à Tauromaquia, houve um trunfo a enumerar com a presença na praça do vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Anacoreta Correia. Ok, não é um presidente de câmara, não é um ministro da cultura, não é o primeiro ministro nem tão pouco o presidente da república, mas já é alguém com responsabilidade política na cidade onde sita a praça de toiros e o Campo Pequeno já o merecia.

Mas a noite tinha outra presença sonante: Morante de la Puebla. O espanhol foi o atractivo maior deste festejo onde desfrutou e fez desfrutar. Já Francisco Palha revelou a maturidade e consistência de resultados e Marcos Tenório impingiu a 'alegria' do espectáculo. Nas pegas, a dureza do curro entoou mais alto e dificultou as suas execuções. No final, tudo em festa, como sempre…

Lidaram-se a cavalo toiros de Canas Vigouroux, bem apresentados, que se deixaram no geral, sendo mais colaboradores o segundo e quinto e mais tardos de investida o primeiro e quarto. A pé, os dois Nuñez del Cuvillo tiveram menos trapio e jogo desigual. O primeiro foi nobre, o segundo de pouca força, teve investida decomposta, sem humilhar. 

Marcos Tenório viu-se melhor no seu primeiro, o qual recebeu à porta gaiola para o levar em brega de forma exímia. O toiro foi melhor a perseguir por trás que pela frente, sendo tardo nas investidas o que retirou transmissão nos momentos das reuniões. Rematou com um par de bandarilhas em terrenos de tábuas para efusivamente se apear e terminar função. Efusividade voltou a ser tónica na sua segunda actuação, ainda que de menor argumento perante outra rês de pouca transmissão e que por duas vezes se adiantou no caminho. Bisou no par de bandarilhas pelo corredor para fechar a lide.

Francisco Palha teve duas actuações consistentes, ambas iniciadas com exímios ferros em sorte gaiola, aliás de destacar que Palha deu sempre importância à ferragem comprida. Resultou mais completa a sua primeira lide pela forma como cumpriu com a brega ajustada, sortes bem desenhadas e o impacto das reuniões, bem como o rematar das sortes. O que na sua segunda actuação já não foi tão notório, pese embora ser assertivo com a ferragem. 

Nas pegas, e pelos Amadores de Santarém, pegou à terceira o forcado Salvador Ribeiro Almeida, com o toiro a acentuar na pega a sua reserva em investir; e Francisco Graciosa também ao terceiro intento e com ajudas carregadas perante outro toiro tardo em se arrancar. 

Pelo Aposento da Chamusca, e em época de despedida, o cabo Pedro Coelho dos Reis, consumou à quarta com ajudas carregadas e com o toiro também a reservar-se ao cite; e João Saraiva muito bem à primeira, com boa ajuda de Pedro Coelho dos Reis. 

No ano em que se compromete a tourear 100 festejos, Morante não poderia falhar Lisboa. Frente ao primeiro que foi nobre, fez as delícias com o capote, para na muleta rabiscar a arte com um toiro que foi mais completo pela direita, com tandas templadas. Já frente ao segundo, animal sem classe, pouco se deixou ver de capote, e ainda lhe torceu o nariz mas houve mérito e esforço em agradar aos presentes quando pegou na flanela, que mesclados com a genialidade de quem a tem de sobra, foi-se impondo e construindo uma actuação com conteúdo. 

A praça contou com cerca de 3/4 de casa para um público que na sua maioria ali foi atraído pela figura do toureio, Morante de la Puebla.

Dirigiu a corrida sem problemas Ricardo Dias, assessorado pelo veterinário Jorge Moreira da Silva. 

Há ainda a ressalvar que por bons minutos houve concorrência à ilustre Banda do Samouco, quando ali a metade do festejo se fez soar um grilo a cantar insistentemente… afinal, também ele queria ver Morante tourear. 

Fez-me pensar no “grilo falante” da história do Pinóquio, a ‘consciência boa’ do famoso menino de madeira. E resta por isso desejar que o grilo do Campo Pequeno sussurre também boas intenções para o cartel que se publicitou ontem como “surpresa”, para que o mesmo venha a ser de facto surpreendente pela positiva, já que falamos da última corrida desta temporada em Lisboa. 
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