Numa temporada curta como a do abono 2022 na Praça de Toiros
do Campo Pequeno todos os ‘cartuchos’ contam… E quando o tiro não é certeiro, o
cartucho é desperdiçado…
Na passada quinta-feira, realizou-se a denominada Corrida de
Homenagem ao Emigrante que anunciava variedade de cavaleiros, dos quais um
rejoneador espanhol e outro mexicano que até confirmou nessa noite a “alternativa”
(sendo que perdura a questão: se no caso dos rejoneadores não existem
diferentes categorias, que alternativa tirou antes que agora confirmou?!). Acrescia
ainda nessa noite o facto de haver um Concurso de Pegas com
desempenho de três grupos dos menos rodados: Amadores da Moita, Arronches e
Académicos de Elvas.
Tendo em conta o cartel ‘internacional’, cumpre sempre lembrar que o
toureio não tem nacionalidade e por isso, não tem nenhum outro idioma a não ser
o da Verdade do Toureio. Pelo que há alguns que se fazem entender, outros nem
por isso…
Nessa noite de Campo Pequeno, a ‘linguagem’ foi variada mas praticamente
toda destorcida, que é como quem diz, Verdade (e toureio) ali viu-se muito
pouca… pese embora me ter parecido que todos saíram em ares de triunfo.
Ao público é legitimo gostar e aplaudir tudo e mais alguma coisa, já que além
de ir ali para se divertir (um aficionado irá sempre para desfrutar e apreciar
a arte), é pagante. Agora o dever de tourear bem, pegar bem e ‘contar’ bem, é
dos agentes da Festa.
Mas adiante…que essa “festa” conto-a eu assim:
Meia praça foi o que se conseguiu num festejo que se coadunou com o tema da
corrida: muitos emigrantes que foram reviver a tradição e muitos turistas que
se apresentaram no Campo Pequeno para conhecerem o espectáculo.
O curro da ganadaria Vinhas anunciava-se pesado mas no geral saíu escasso
em trapio para aquela que se diz a primeira praça do país. Em comportamento também
foram díspares: o primeiro teve mobilidade sem se entregar; o segundo serviu mas
andando quase sempre a passo; o terceiro foi paradote mas a adiantar-se nas
sortes; o quarto foi outro manso reservado que no momento do ferro também
encurtou caminho; o quinto teve mais vontade em se empregar; e o sexto o mais completo
da corrida e que a ver do ‘inteligente’ originou volta ao ruedo do representante
da ganadaria.
O mexicano Emiliano Gamero abriu a noite à conta da dita ‘confirmação de
alternativa’ e não sei se às custas da responsabilidade de ser o primeiro, ou
do peso (que o tem) a praça de Lisboa mas os argumentos dados pelo ‘charro’ não
foram convincentes para quem entende o toureio a cavalo de outra forma. Um
ferro violino e o cavalo a empinar-se foram motivo de forte ovação por parte do
público e, se até aqui a lide decorria sem música (sinal de bom critério), não
se entende o porquê do director de corrida ter mudado de opinião e principalmente
fora de contexto, já que o lenço branco coincidiu com o momento em que se apeou
o mexicano para se despedir de Lisboa… Esperemos que melhores desempenhos possam
acontecer nos tantos cartéis onde se anuncia Gamero.
Rui Salvador, a cumprir naquela noite 38 anos de alternativa, foi autor de
uma lide em crescendo tendo a sua veterania e arrimo, vindo ao de cima nos
curtos. Com o toiro sem comprometer, o cavaleiro sobressaiu na brega ajustada e
a fazer uso dos ladeios para levar o toiro fixo, e quase sempre a passo, destacando-se
no que foi o terceiro ferro, o mais ajustado.
Manuel Telles Bastos esperou o toiro à porta gaiola mas este trocou-lhe as
voltas e não se mostrou interessado na montada. Soube dar importância à ferragem
comprida mas nos curtos teve o susto de forte toque o deitar ao chão aquando a
cravagem do primeiro. A actuação daí não rompeu, com o toiro a dar sempre
sinais de encurtar o caminho, principalmente ao quinto ferro com que fechou
prestação.
O rejoneador espanhol Andrés Romero, que brindou ao matador mexicano ali
presente nas bancadas, Joselito Adame, viu-se perante um manso tardo e desinteressado
e com isso logrou alguma irregularidade na actuação entre ligeiros toques e passagens
em falso pese embora a voluntariedade do rejoneador em deixar a ferragem.
Miguel Moura protagonizou o verdadeiro momento de emoção da noite: uma
vibrante e bem conseguida sorte gaiola ao primeiro comprido. Voltou a ter
qualidade o segundo comprido para nos curtos se ver mais discreto, citando
quase sempre a dar distâncias e com batidas ao pitón contrário mas sem romper.
O mais novo do sexteto, António Prates, foi autor da actuação mais completa
e regular da noite, fruto também das qualidades do oponente que teve por diante.
Denotou sentido de lide, intenção na boa preparação das sortes e a cumprir
correctamente com a ferragem, principalmente o terceiro curto, terminando a
lide com um quiebro impactante nas bancadas.
E se a cavalo a irregularidade marcou a noite, nas pegas a dificuldade foi
a tónica.
Que os toiros foram mais ‘broncos’ nas pegas, foram, mas na maioria das
vezes por falta de certa proficiência dos seus autores, resultando algumas
pegas aparatosas e em consequência, com mazelas.
Pelos Amadores da Moita, pegou David solo à segunda com boa eficácia do
primeiro ajuda; e o obstinado Fábio Silva concretizou à quinta a sesgo e depois
de vários intentos com o toiro a despejar tudo e todos.
Pelos Amadores de Arronches, Luís Marques consumou à quarta e com ajudas
carregadas; e Rafael Pimenta à segunda, com uma pega que fez eco nas bancadas.
Pelos Académicos de Elvas pegou Paulo Maurício concretizou à segunda, pegando
com decisão; e Gonçalo Machado que citou com galhardia, reuniu à barbela e
consumou juntamente com os restantes elementos, uma pega tecnicamente correcta
e à primeira, sendo por isso merecedor do prémio de Melhor Pega em disputa.
Dirigiu a corrida com um critério que não foi de exigência, o senhor João
Cantinho, assessorado pelo veterinário Jorge Moreira da Silva.
E assim se gastou um cartucho, faltando agora apenas dois espectáculos
tauromáquicos para terminar o abono deste ano em Lisboa. E, se já anunciada uma
Corrida Mista para dia 18 que augura competição e com Figura espanhola, que o
último festejo possa (pelo menos em qualidade do cartel) encerrar em Grande, a Pequena
temporada do Campo Pequeno…
Patrícia Sardinha
