O instinto que o Toiro tem, da sua força e do seu poderio, é
o que lhe faz investir com valor cego e coragem ao que se lhe ponha por diante,
sem temor ao perigo que possa existir, isto porque não o conhece. 
O Toiro, na amplitude ilimitada de definições que o possa
julgar, enriquece a descrença na razão, desvaloriza o esperado e desperta a
emoção e o peso que as emoções podem suscitar, sem medir Homens, sem escolher
conhecimento, sem crer no óbvio. A paixão que alimenta a festa é a paixão que
sustenta a luta, que cria a ânsia, que gera expectação, medo, suspense e
admiração. 
E o Toiro, indomável e selvagem, há-de agradecer àquele que,
valente e sábio, consiga passar para quem assiste, que o que se faz diante dele
não é acessível e muito menos exequível a qualquer ser.
Doña Mercedes Picón, Marquesa de Seoane,  obreira e Senhora, enriqueceu o Toiro e a sua
incógnita, preservou-o na sua essência mais pura e nunca abdicou da sua
independência, passando em boa hora a sua sensibilidade a seu filho, D. Tomás
Prieto de la Cal. 
E se nada importa si
no hay Toro, importará a obra que se faça diante ele para redobrar o valor
do Homem, mas ontem… Lo siento D.
Tomás.
E digo isto pois quando houveram momentos em que se sentiu a
falta do Toiro (e da fiereza que se espera da divisa vermelha e amarela), houve
outros em que faltaram toureiros, em que faltou sentir-se a emoção de se
enfrentar o perigo no seu espaço e fazer crer que ali, nasce a obra e a verdade
mais dura. Ali nascem os triunfos e as recordações. Nos sítios que dão medo,
nos ambientes que são hostis. A grandeza assume-se de outra forma. 
E Vila Franca ainda pede valor, ainda pede crédito, ainda
pede Toiro e Toureiro. Pode que mais comedida e limitada a um número dos que
são verdadeiros e intransigentes, mas o sabor, nos detalhes, está lá. 
Despertava interesse a corrida vinda de La Ruiza, finca da Ganadaria Prieto de la Cal,
mesmo que, num ano atípico e de muitas dificuldades, houvessem ferros
portugueses que poderiam e também mereceriam tal posto na Palha Blanco, ainda
assim, aos amantes do Toiro, a aposta da empresa Tauroleve era merecedora da
deslocação à Feira de Outubro.
Os vazqueños da divisa espanhola, com idade (e bem
cumprida), não foram os expoentes máximos das características que um aficionado
espera quando se anuncia uma corrida de sangue Veragua, contudo, nem sempre
foram entendidos ou postos num patamar salutar.
O primeiro da tarde, que foi timidamente ovacionado, acusou
na báscula 480kg. Com 5 anos, luzia uma bonita pinta jabonera e não tinha uma
cara intimidante, mas era bem feito, curto e musculado. Saiu desconfiado, a
mirar e com muita facilidade em desligar, solto e rebrincado a desplazar nos
voos.
Não foi um toiro fácil, pedia sempre voz e toda a atenção
para si, caso contrário, desistia e procurava luta noutros sentidos da praça,
não ostentando qualquer fijeza. 
Manuel Ribeiro Telles Bastos sente Vila Franca como sua, e
esse peso também acaba por ser determinante na hora de adotar decisões mais
extremas, sendo isso que faltou ao toureiro. Ligar-se com ele, mostrar-lhe que ali
era um contra um. Entre passagens em falso e a pecar por aprumo nos embroques,
não houve harmonia suficiente para o cativar, nem para o contrair à sua
conduta.
A dar o exemplo, Pedro Espinheira, cabo dos Amadores do
Ribatejo, não encontrou dificuldades em fechar depois de uma reunião pouco
brilhante mas muito efetiva, com o grupo a responder de forma pronta e muito
eficaz.
O segundo da tarde deu-me aquele arrepio que sentimos quando
vemos um Toiro bravo a galopar e a transmitir… quem sente sabe do que falo. A
ponto de cumprir 6 anos de idade, saiu sério e como é timbre de Veragua à
entrada em praça, com raça, a perseguir com importância e a transparecer
seriedade em cada passo dado. Pesou 520kg, tinha cara e uma expressão mais
bonita por cativante. Saía e prestava-se à luta até que se aborreceu, mas
quando o fez foi com a mesma atitude e altivez, e apurando sempre mais o seu
sentido conforme as abordagens, mais geniudo
que fiero. Desplazava nos capotes, e
vinha com pata, sem qualidade mas com som, uma nota dominante na corrida.  Foi um Toiro importante, com detalhes
completamente percetíveis pela idade e inteligência que adquira, até que se
aborrecera. Aplaudido na sua recolha.
Marcos Tenório, que alcançou um dos momentos da corrida
quando o recebeu com ganas à porta gaiola, não transcendeu o bom que augurava e
o que se previa. Era centrar-se com ele e dar-lhe ar, e Marcos, quando o
conseguiu, passou a seriedade que o Toiro tinha. A actuação veio a menos, o público
protestou os bandarilheiros (fazia falta Vila Franca todo o lado), e gorou-se a
oportunidade de meter a Palha Blanco em pé. Recusou, num gesto digno, a volta.
Pelos Amadores da Chamusca, Miguel Borges recebeu com ímpeto e agarrou-se com
tudo, vindo pendurado num dos pitón. O Grupo conseguiu com prontidão tapar a
cara ao Toiro e ajudar com decisão.
O terceiro marcava o número 71, feio de cara e de tipo,
também ele jabonero, 5 anos cumpridos e uma saída com pata para a sorte de
gaiola de Rouxinol Jr, que passou em falso. 
Toiro difícil por manso, desinteressado e a querer também
que a luta fosse dentro do seu reduto, no seu terreno, resultando a atuação
custosa e inglória para o toureiro de Pegões, que não se adaptou ao condão do
Toiro. Mandava nos médios e ali se deixava bronco, mas era ali que havia que
pisar com força, e perto dele. Manuel Maria Vicente, mostrou-se no cite,
carregou-o e reuniu com vontade, estando o Grupo, os Amadores de Beja, pronto e
com nível a ajudar, fechando meritoriamente à primeira.
O quarto, com 5 anos,
berrendo em negro, calçado, de cara aberta e perfil anovilhado, não teve imposição
de Toiro. Pesou 505kg sem qualquer personalidade, fácil e nobre, que se parava
indiferente e não se interessava se não fossem ao terreno do valor e que
antigamente se dizia, do dinheiro… 
Manuel Telles Bastos saiu mais disposto do que no anterior,
com uma sorte gaiola intencionada mas pouco cingida. A fase de curtos foi
difusa e longe de entusiasmar, sem haver uma declaração de intenções por parte
de nenhum dos intervenientes. Houve falta de cites com poder e de se arrimar
com tudo, mas não aconteceu. Fábio Costa esteve valente com ele e conseguiu
consumar sem grande dificuldade, mostrando-se poderoso para a pouca raça do animal.
O Grupo do Ribatejo, tal como no seu anterior toiro, empregou-se e ajudou com
vontade, consumando ao primeiro intento.
O 38, jabonero sucio,
era morfologicamente muito equilibrado, com melhores hechuras que seus irmãos. Tinha uma cara medida (mais séria nas
fotos a campo), com pescoço e uma bonita maneira, mostrando o seu semblante.
Faltou-lhe rectitud, e faltou-lhe
força. Inicialmente andou trotón e sem vontade, condição que, ainda que parca e
ausente de transmissão, se tenha diluído para uma segunda fase em que se
mostrou voluntarioso e que se permitiu a ser vencido. Doeu-se algumas vezes,
reponía mais no capote, com uma suavidade mais aparente. Marcos andou
desacertado na cravagem e colocação, e tal como no primeiro, o esforço
tornou-se insuficiente para alcançar outro resultado. 
Bernardo Borges esteve como o animal pedia. Saiu com o trote
que o dominava, meteu a cara de perfeição e empurrou rectílineo, estando bem
forcado e grupo a ajudar. 
O toiro que mais me gostou (na apresentação da corrida) saiu
em sexto lugar, também ele cinqueño, com 515kg. De pelo melocotón,
apresentou-se escorrido por trás e sem a importância que previa. Saiu como a
generalidade dos seus irmãos no que toca a disponibilidade, pedindo tudo a seu
gosto e não oferecendo nada. Desinteressado em grande parte do tempo, fez
Rouxinol Jr suar para o contrariar, embora o tenha sentido muito menos confiado
que o costume. Houve intenção em citar e em colocar-se, mas o que se espera nos
ferros é o atrevimento que teve a cravar um palmo com que fechou, o que se viu
melhor. O toiro custou a repetir, parando-se no centro da arena e deixando
apenas a sua nobreza permitir ao toureiro porfiar por algo que, ingloriamente
não atingiu. O penúltimo curto e o palmo, tiveram mais força. 
Francisco Patanita, por Beja, citou com preciosidade o
Prieto de la Cal. Silenciou a Palha Blanco, meteu consigo o Toiro e viveu-se um
momento importante. O Toiro partiu sério e a romper, com o forcado a recuar
pouco mas a reunir com raça e tenacidade, estando o Grupo muito metido e unido
a ajudar, em todos os sentidos. Foi aplaudido de pé e solicitada segunda
chamada à arena, a qual recusou.
A Palha Blanco encheu, dentro das normas em vigor, sendo a
corrida dirigida por Ricardo Dias, com decisões e critérios questionáveis. 
Pedro Guerreiro
