Crónica: "Um Campo Pequeno de máscara mas cheio de emoções"

NATURALES
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Não ía aos toiros desde Fevereiro e até pensei que dificilmente voltaria a uma praça este ano. 

 

Felizmente tudo se proporcionou para que pudesse ir ver “os da tua terra” como me diria Miguel Ortega, “gravista” dos quatro costados e mais algum, caso houvesse...

 

Fui, e fui desconfiada, não pelos toiros que à parte de pastarem no meu concelho, garantiam interesse pela seriedade imposta nas fotografias que iam sendo divulgadas, mas sim com desconfiança de como seria viver este “novo normal” (ou anormal?!) de uma corrida de toiros limitada por uma série de regras e imposições.

 

Uma delas, a mais visível e a fazer todo o sentido tendo em conta a pandemia, o uso de máscara.

 

Pois bem que me surpreendi. 

 

Apesar de “mascarados”, o Campo Pequeno transbordava ambiente, expectativa, e tinha quase tanta gente na assistência (pouco terá faltado para esgotar a nova lotação imposta) como uma outra qualquer corrida de temporada anterior onde era permitido o 100% de casa. Lisboa continua igual…

 

Sim, existem algumas imposições sem nexo, como a saída e a entrada da teia dos Grupos de Forcados consoante a sua vez de pegar, mesmo tendo eles na véspera realizado o teste à Covid-19, mesmo havendo dimensões e distância suficiente para garantir segurança na trincheira de Lisboa… Mesmo assim, não lhes é permitido permanecerem durante a prestação do outro Grupo.

 

Mas voltando ao que agora importa…

 

Independentemente do resultado artístico que cada um veio depois a lograr, é de se enaltecer em primeiro lugar, a disposição dos artistas em actuarem neste festejo. Principalmente quando se está praticamente “a crú”, numa temporada que só agora se inicia, para mais sendo na primeira praça do país, e perante a seriedade com que os “graves” se apresentavam. Não era de facto um desafio para qualquer um e por isso alguns terão recusado o “convite”.

 

A beleza dos ‘murteira grave’ precedia o que viesse a ser o seu comportamento. Por isso mesmo, na maioria, foram recebidos com palmas aquando da sua saída à arena. Foram toiros de praça de primeira, não defraudando quer em apresentação quer em comportamento, já que acima de tudo foram animais exigentes e que transmitiram, inclusive ao público. E quando o público dá primazia ao toiro, Olé! Já é meio caminho andado… Saíu reservado o primeiro, destacando o terceiro e quinto da ordem com honras de ganadero à praça. Defeito geral? Rasparam. Mesmo os dois que sobressaíram pecaram por isso. Se se acaba a Primavera? Depende do que se exige.

 

Em relação às lides a cavalo, Ana Batista teve a responsabilidade de abrir praça na noite em que Lisboa lhe tributava homenagem pelos 20 anos de alternativa. Frente ao tardo primeiro acusou uma actuação irregular consentindo demasiadas passagens em falso. Melhorou disposição com o segundo do seu lote, principalmente quando lhe entendeu os terrenos e encurtou distâncias evitando que se distraísse. Manuel Telles Bastos nem sempre se acoplou ao segundo da noite, impingindo inclusive alguma velocidade nas sortes. Andou mais comprometido com o bom quinto da ordem, um toiro que veio a mais, que perseguiu com raça e humilhando, arrancando-se pronto várias vezes. Telles Bastos, ainda que consentido alguns toques pelo meio, primou pela ligação imposta na brega e logrou alguns ferros de boa nota. Luís Rouxinol Jr. apresentou-se como o mais valente da primeira parte do festejo quando mandou recolher os subalternos para receber o burraco de Murteira Grave numa sorte gaiola que resultou traseira. Nos curtos, aproveitou a nobreza e a mobilidade da rês para essencialmente brilhar em ladeios e recortes, destacando o terceiro ferro e o palmito. Frente ao último voltou a demonstrar entrega e quis bisar na sorte gaiola mas o toiro trocou-lhe as voltas pois perdeu as mãos e impediu o ferro. Nem sempre houve ajuste nas reuniões e perante um toiro que transmitiu pouco no momento do ferro, a actuação do jovem cavaleiro subiu de tom com o palmito e par de bandarilhas com que encerrou função.

 

Nas pegas, dois dos grandes Grupos de Forcados do nosso país deram mais emoção à corrida. Pelos Amadores de Montemor, o aniversariante Francisco Borges esteve enorme e deu o mote a uma grande noite, mandando no toiro, deixando-o vir para se fechar com decisão e a consumar nas tábuas com o grupo coeso a ajudar. Também José Vacas de Carvalho consumou à primeira, com o toiro a partir alegre para depois quase se parar no momento da reunião; e Bernardo Dentinho aguentou a investida com pata do seu toiro para consumar bem à primeira tentativa. Pelo grupo de Vila Franca, o cabo Vasco Pereira esteve valente a aguentar os fortes derrotes que o toiro arremessou mas acabou por sair quando praticamente se dava a pega por consumada e concretizou ao terceiro intento; David Moreira pegou à segunda com o toiro a meter a cara baixa; e Rui Godinho terminou a noite à primeira com uma boa pega.

 

Foi portanto uma noite de muitas emoções, algumas mais extravasadas que outras, mas que o uso de máscaras não impediu de se viver e sentir naquela que foi a 2ª corrida de abono em Lisboa.



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