Crónica: "No Colete Encarnado a Festa foi ao Rubro"

NATURALES
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Grande ambiente aquele que se vivia nas imediações da praça de toiros Palha Blanco e, em pequenas tertúlias informais, toda a gente comentava o acontecido na véspera na praça de toiros de Coruche.

O caso não era para menos já que, os toiros que se iriam lidar nesta tarde, seriam os irmãos de camada dos da noite anterior.

Expectativa em alta e um certo nó na garganta dos aficionados que viriam a preencher cerca de três quartos do aforo do tauródromo vilafranquense.



ANTÓNIO RIBEIRO TELLES: AMO, REI e SENHOR!

O primeiro da tarde, negro de pelagem, corniaberto, algo “tocado” e com o peso de 485 kgs, revelou-se manso “doendo-se” ao sofrer o primeiro castigo. António Ribeiro Teles apercebeu-se ao segundo comprido que tinha por diante um toiro encastado que perseguia e atacava quando provocado. As suas arrancadas eram bruscas e sérias e o Maestro da Torrinha puxou dos seus galões, fez gala dos seus conhecimentos e da excelência da sua monta para, num alarde de toreria, dominar o morlaco, aproveitando os seus ímpetos, para nos deliciar com um toureio do mais fino corte e ferros de grande emoção com realce para os últimos três ferros, com reuniões de verdade e cravagem de alto a baixo.

O seu segundo, quarto da ordem, castanho de pelagem, o mais pesado e rematado da corrida com 525 kgs, sério e bem posto de córnea, revelou sinais de mansidão, de muito sentido, desinteressado e enquerençado em tábuas. Os mansos também têm lide e António Telles, devido à sua veterania, intuição e aficion, sabe bem como fazer e ultrapassar as dificuldades que os toiros lhe possam impor. Recebeu-o com uma porta gaiola emotiva e deu importância ao cravar o segundo comprido numa excelente tira. Na série de curtos lidou com critério, bregou a preceito, levando o toiro ligado á garupa da montada depois de o retirar da querença, deixando-o em terrenos apropriados para, sem nunca lhe perder a cara, interessando-o, citar, deixando-se ver, atacar entrando nos terrenos do toiro, provocando-o, para lhe deixar, a sua vez, três ferros de grande categoria com o toiro dominado, reunindo com o morrilho debaixo do braço para cravar com verdade o que lhe valeu, no final, duas triunfais voltas à arena com o público, em extâse, entregue ao seu labor. Resumindo, António Ribeiro Telles foi amo, rei e senhor da tarde com duas lides de senhorio e maestria.



FRANCISCO PALHA, CARA E COROA

Francisco Palha esteve em plano superior perante o seu primeiro. Um toiro castanho, emorrilhado, acapachado de córnea, com o peso de 490 kgs, que deu maus sinais nos capotes, acometendo e rematando com as patas por diante, esparramou vista e não se empregou na lide. Francisco Palha muito porfiou para conseguir os seus intentos numa lide de menos a mais. O toiro era de meias investidas e com a sua garra e valor, a que já nos habituou, o jovem cavaleiro, após consentir em demasia, no segundo comprido, em que sofreu um toque violento na montada, não se intimidou e a série de curtos foi de elevado nível provocando e cravando com emoção, em terrenos de compromisso. O público era vê-lo, de pé, ovacionando a triunfal actuação de Francisco Palha. O seu segundo, quinto da ordem, negro de capa, corniaberto, com 480 kgs, fugiu à regra do “no hay quinto malo”. Foi mau em todos os sentidos e não permitiu, ao cavaleiro, o luzimento alcançado no oponente anterior. Palha teve dificuldade em entendê-lo, tendo utilizado três montadas, mas nem assim conseguiu que a lide fosse consistente e que os ferros resultassem da melhor forma. Mesmo acarinhado pelo público, recusou dar volta indo apenas aos médios com o forcado agradecer as palmas recolhendo de imediato. Francisco Palha viu assim a “cara e coroa” da tarde.



ANTÓNIO JOÃO FERREIRA SEM OPÇÕES PARA TRIUNFAR

Ninguém pode negar o valor seco, a entrega total, o profissionalismo assumido e o querer de superação daquele que eu considero o mais injustiçado dos matadores de toiros portugueses da actualidade. Pelo supracitado, julgo que António João Ferreira merece mais oportunidades, principalmente em Espanha e, também, porque não, por parte das empresas nacionais. Antonio João Ferreira teve o “santo de espaldas” no que concerne aos toiros que lhe couberam em sorte. Apenas e só se pôde ver umas cingidas verónicas e tafalleras ao seu primeiro e um ou outro muletazo que, quando ligado ao segundo, se pensaria que poderia sair uma tanda completa, os seus, e os nossos, desejos saíam frustrados. Ou pela brusquidão com que oponentes saíam do último terço do muletazo, a rematarem por cima do estaquillador, ou por se “reponerem” com um perigo surdo, quase sem deixar respirar o toureiro. Foi sincero, exigente, valoroso, persistente, clarividente, respeitador perante os toiros, com idade e com cara, mas, a meu ver, talvez tivesse faltado um “puyazo” em cada toiro. Talvez as coisas tivessem sido diferentes. Teve mérito a sua entrega e o seu labor mas apenas se ficou por saudar após o seu primeiro e uma carinhosa, compreensiva e aceitável volta após a lide ao seu segundo e último da corrida. De destacar o (muito) bem que se bandarilhou por parte de Tiago Santos, João Oliveira e João Ferreira, todos eles assomando-se “al balcon”, com verdade, sendo obrigados a saudar montera em mão. Não foi como de outras vezes. O triunfo não surgiu mas ficou a vontade de o rever com outros toiros que lhe permitam efectuar a tão sonhada e desejada faena.



FORCADOS DE VILA FRANCA EM TARDE DURA HONRANDO PERGAMINHOS

O Grupo de Vila Franca nota-se estar em franca renovação. As caras a que nos habituámos nos últimos dez,quinze, anos já lá não estão. É natural que assim seja. Os mais novos ocuparam os seus lugares e têm a obrigação de defender a honra e o prestigio alcançado. E assim o fizeram com galhardia e valor. A tarde foi dura muito por culpa dos toiros. David Moreira apenas à terceira tentativa, e com ajudas carregadas, conseguiu imobilizar o primeiro da tarde. Secundaram-no Pedro Silva, também à terceira tentativa, Rui Godinho numa excelente pega ao primeiro intento e Guilherme Dotti ao terceiro encontro. Referências para o popular rabejador Carlos Silva chamado para dar volta após a pega do quarto da ordem e de Diogo Grilo, após a última pega da tarde e de uma excelente ajuda a Guilherme Dotti.

EM JEITO DE RODAPÉ

Uma tarde de emoções e de bom toureio a cavalo. Vontade de rever António João Ferreira. Toiros que não facilitaram e com vários matizes. Forcados de nota alta a merecerem mais corridas. Público entregue e preso ás ocorrências na arena e o colorido dos homens dos coletes cor de fogo, os Campinos. A festa é em sua honra mas toda a gente se divertiu e festejou.


Raul Caldeira
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