Crónica de Lisboa: “Foi-se um ’filão’ pela Porta Grande”

NATURALES
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O matador de toiros espanhol Juan José Padilla anunciou este ano que iria cortar a coleta e colocou Lisboa na rota das praças das quais se está a despedir. Uma passagem mais que prevista e justa, dado que nas últimas temporadas, Lisboa deu a Padilla um ‘altar’ e Padilla deu a Lisboa a certeza de praça cheia.

O toureiro tornou-se assim num “filão de ouro” para o Campo Pequeno, sendo repetido nesta praça desde 2016, por vezes até a bisar na mesma temporada, e a revelar-se um verdadeiro ídolo das bancadas.

Ontem, quinta-feira, esse “filão” voltou a sair pela Porta Grande do tauródromo lisboeta… Um gesto previsível, pois a referida porta sempre pareceu estar destrancada a Padilla, fazendo até quase parecer ser uma condição certa no seu contrato para vir a Lisboa. Só que desta vez, a passagem pode ter sido definitiva. Pelo que este escrito poderá não ser visto como uma crónica, já que mais do que uma corrida de toiros, presenciou-se em Lisboa a um evento com um propósito, uma despedida, qual ‘procissão do adeus’.

Goste-se que não se goste, Padilla, que até 2011 era um toureiro de tragar tudo e mais alguma coisa que outras vedetas não queriam, passou a incontestável presença nas primeiras praças e feiras, um fenómeno de superação…um “case study”. Ninguém ficou indiferente ao que o Homem viveu e à forma como o Toureiro deu a volta por cima após a grave colhida em Saragoça.

Por isso, nem sempre as ovações em Lisboa, o delírio, as duas ou três voltas por lide à arena, as saídas pela Porta Grande, foram ajustadas à qualidade do toureio de Padilla. Pois o que de facto, Lisboa sempre enalteceu e ovacionou foi a entrega, a raça, a diversidade e o valor do toureiro tendo em conta as suas limitações.

Ontem isso voltou a ser notório. O público estava com Padilla, ponto final! E ele fez o que lhe competia para o satisfazer. Das suas duas actuações, terá mais destaque a primeira, onde por entre muito desplante e floreado, se lograram ver passes com algum mérito, principalmente com a mão direita. Já no que foi o último da corrida, custou-se a empregar o toureiro por entre muletazos soltos. 

Mas foi quando se deixou apanhar, e dos tendidos lhe cantaram um “flamenco” de espontâneo, e lá do alto das galerias a Banda do Samouco lhe dedicou o pasodoble homónimo, que o artista Padilla cresceu mais ao ‘castigo’ e se enraçou com um toureio populista.

Deu duas voltas em cada faena, se não pedidas, por vontade própria.

Se as merecia? Se a Porta Grande foi justa? Tanto quanto outras voltas e outras Portas Grandes já ali vistas. Mas ontem… Ontem despedia-se Padilla da sua Lisboa! E mais critério, menos critério…

Com verdade andou o bandarilheiro João Ferreira nesta noite. Se andou bem na brega a coadjuvar Duarte Pinto, melhor andou nos pares que deixou no tércio de bandarilhas às ordens do matador.

Já o restante festejo taurino resume-se ao seguinte:

Foram lidados quatro toiros da ganadaria Vinhas (lides a cavalo), bem apresentados no geral, pesados mas escassos de transmissão. Saíram mais reservados os dois primeiros e voluntariosos os da segunda parte, destacando-se o terceiro toiro do curro vindo da Herdade do Zambujal. A pé, lidaram-se dois toiros de Varela Crujo, justos de cara e a investirem com pouca raça.

Nas lides a cavalo, dois jovens cavaleiros a quem a empresa entendeu repetir como ‘bonificação’ por anteriores ‘triunfos’ esta temporada naquela praça. João Moura Caetano teve passagem discreta pelo Campo Pequeno. Se no primeiro do seu lote, andou mais disposto mas as reuniões resultaram pouco ajustadas, frente ao segundo, careceu a lide de mais ofício e menos intermitência. Também Duarte Pinto não conseguiu redondear. Do primeiro, ficou o primeiro curto, com uma lide também ela de altos e baixos. Enquanto no segundo, foi eficiente na brega e na lide do toiro, assim como no conceito de um toureio recto, contudo por vezes abriu cedo o quarteio, pelo que nem sempre resultaram as sortes ao estribo.

Nas pegas, pelos Amadores de Santarém, António Toureiro efectivou à primeira sem problemas, com o toiro a arrancar-se ao cite com alegria, fechando-se o forcado com decisão. Já Ruben Giovety não teve noite feliz. Depois de um susto no primeiro intento, levantou-se decidido mas só acabou por concretizar ao sétimo intento.

Pelos Amadores de Montemor, João da Câmara consumou à primeira uma pega rija; e Francisco Bissaya Barreto depois de um primeiro intento em que o toiro o despejou da cara, fechou-se como uma lapa à segunda tentativa. Em ambas as pegas, há a destacar o labor do primeiro ajuda.

Dirigiu esta corrida de praça praticamente cheia, e dentro da benevolência que uma ‘corrida de despedida’ permitia, o sr. Manuel Gama assessorado pelo veterinário Jorge Moreira da Silva.

E assim, numa noite de Setembro, despediu-se dos portugueses aquele que para o Mundo virou um mártir, para a Tauromaquia um herói e para Lisboa um ídolo…e um “filão”.




Patrícia Sardinha
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