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    Crónica da Granja - Um olhar desolado entre o fracasso





    Os olhos de quem sonha. De uma alma que efervesce buscando a utópica razão de desvendar infinitamente um segredo, de bravura e medo, de pavor ou terror, mas também de gentileza, de atitude nobre e senhorio. Os olhos de quem cria o Toiro. O Toiro. 

    Joaquim Alves de Andrade tem essa mirada, de quem sonha e projecta, de quem realiza e procura, e no fundo acha… mas o seu olhar inocente e profundo, entre uma cara cansada de uma vida plena e vivida (com todos os méritos que aí acrescem), deu hoje lugar a uma visão distante e bassa da tarde. Estava a desolação explanada em si… e logo pelos seus toiros, a saírem por baixo, nem sempre de forma injustificada, mas na globalidade, sem o fundo que o seu amo espera deles. 

    Seis toiros de Pinto Barreiros bem apresentados, abundando o trapio se em conta tivermos a categoria do tauródromo, mas que pecaram pelas condições que leva à sua criação. A querer mais do que podiam (o calor de todo o dia, o deficitário piso acabam por ser condicionantes), o mau trato que praticamente todos foram alvo, e aliando isso à falta de potabilidade, acabaram por tornar-se uma agravante toda a tarde.

    Filipe Gonçalves abriu praça perante a um castanho que era um taco. Tronco medido, curto de mãos, rematado e morrilho bem desenvolvido, com cara agradável e excelentes hechuras. Levou capotazos em excesso, andou pouco e sem motivação, tapava-se nas reuniões e careceu de raça. 
    Filipe Gonçalves andou desacertado nos compridos e sem transcender nos curtos, irregular e sem chispa.
    O seu segundo, também ele castanho, alto e montado, com cara e trapio, bem estruturado e sério de verdade foi um toiro manso e cobarde, sempre a procurar refúgios, mas que também não foi bem cuidado e por isso, veio a menos. Capote aqui, capote ali, terreno para aqui, terreno para ali… Os compridos, com mais intenção que mérito, resultaram desconfortáveis no dorso do animal, que se doeu, e na lide de curtos, mais comunicativa e para a galeria, faltou maior incisão do cavaleiro, que ainda assim logrou um ferro de qualidade, o terceiro. Fechou com dois violinos pós número, que animaram um público carente de conhecimento. 

    Francisco Palha conseguiu cobrar dois ferros contundentes e expressivos pela verdade que ostentaram a um toiro congestionado e fechado em tábuas… e não conseguiu dizer nada perante um toiro que andou e várias vezes se moveu por vontade (e não por inércia, inclusive nos capotes). 
    O seu primeiro, de Pinto Barreiros, fora devolvido por aparente inferioridade num dos membros superiores, trocando-se a ordem de lide e saindo o segundo animal do seu lote, com as marcas de São Torcato.
    Algo acochinado, pegado ao chão por curto e baixo que era, mas tinha uma fronte convidativa e não lhe faltava coisas para augurar bom presságio. De pelagem a fazer lembrar um animal retinto pela sua tonalidade castanha, meteu a cara com som e franqueza no capote de início, mas sempre dentro de uma mansidão encastada e de luta ofensiva, até que a meio da lide, se tornou mansidão rachada e defensiva, congestionando em tábuas e não saindo de forma alguma. Duas tiras medidas e precisas, cobradas com facilidade e acerto, foram precedidas por dois curtos passados e sem qualquer acople sentido na preparação das sortes, resultando um deles até demasiado traseiro em colocação no toiro. A partir deste momento o toiro, também ele fastigado pelas adversas condições da tarde e do trato, e aliadas às suas, parou-se completamente em tábuas e não mais se movimentou. Palha trocou de montada e surgiu mais geniudo, para cobrar um curto que foi sentido como espontaneidade, com a montada atacando e naturalmente impactando mais, girando depois bem sob o pitón e saindo ileso. Antes de fechar, sacou de novo génio e cravou a sesgo com igual mérito. 

    O quinto, castanho escuro, com esqueleto e barbela desenvolvida, bisco do pitón esquerdo, feio e sem tipo para estar a gosto. Saiu alegre e com pata, perseguindo com tranco e codícia, arrancando também quando citado de longe e a querer empregar-se na brega, embora sempre limitado pela falta de força, um denominador comum de toda a corrida. 

    Francisco Palha não o potenciou na primeira fase, aliás… até lhe absorveu um pouco as virtudes, visto tê-lo descomposto procurando a câmbios deixar os compridos, e a partir daí, faltando mais franqueza do toiro para se empregar nos embroques. Louve-se a intenção do artista em tentar agigantar a nobreza do toiro, mas a falta de casta do mesmo impossibilitou de chegar a mais no final e aguentar uma lide longa, mas que deixou pouco na retina. Tentou imprimir som aos ladeios ajustados, encarou de frente o oponente, mas tiveram em falta jurisdições que se assemelham-se ao que dele se espera este ano, terminando regular mas vulgar. 

    Miguel Moura esteve completamente condicionado com o terceiro da tarde, um negro bragado meano listón e axiblanco, que estava sem força e sem vontade, sem fundo e sem condições muito apelativas, e que acabou afogado por ofegante. Esforçou-se o jovem cavaleiro, mas com falta de resposta e também sem alcançar sequência, viu-se obrigado a abreviar. 

    O animal que fechou a tarde (já noite e perto das 03h de corrida, que viriam a ser atingidas), foi um castanho de muita cara, com a córnea desenvolvida e aberta. Saiu com pata e a todo o gás dos curros, esperando-o bem o cavaleiro, aguentado a montada com mobilidade a codicia do toiro. 
    Confiando-se aos poucos, o que melhor se viu de Miguel foram os compridos, em que se sentiu poder com o toiro e cravar-lhe dois ferros com garbo e em sortes frontais. O cornupeto andou sem transtornar, dentro da falta de força aparente e do quão diminuído o terreno o deixava, e o cavaleiro tentou ser dinâmico e chegar ao público, algo que surtiu efeito mas por mais facilidade e alívio, sentindo-se apenas compromisso num quiebro em que o cavalo escapa elástico do toiro e o jovem cavaleiro solta o ferro com o toiro humilhado e debaixo do braço.


    Tarde tranquila e qualitativamente satisfatória no que diz respeito às jaquetas de ramagens, com um reparo ou outro que urge corrigir, mas ainda assim, sem comprometer desempenhos.
    Devido às trocas e devoluções, o Real de Moura, acabou por pegar os três primeiros toiros da tarde, fechando uma primeira parte em pleno, com especial destaque para a forma exímia como foi ajudado todo o lote.
    Gonçalo Caeiro esteve correcto diante o primeiro, que meteu a cara rijo mas acabou por não impor dificuldade, bem o forcado a consumar à primeira tentativa; Carlos Mestre mostrou a calma necessária e a vontade suficiente para se fixar na cara do São Torcato, que assim que se sentiu cativado saiu franco e com pata, metendo bem a cara e levando-a por alto até ao seio do grupo, com o cara bem fechado e o grupo bem entrosado a ajudar; Luís Bate não reuniu da melhor maneira perante o terceiro, mas ainda assim a vontade de ficar resultou como chave para uma tentativa de mérito e em que o toiro ganhou nova vida após a lide, estando o grupo coeso para fechar ao primeiro encontro.

    Os Amadores da Póvoa de São Miguel, tal como o vizinho Grupo de Moura, conseguiram três desempenhos ao primeiro intento, enfrentado os três toiros saídos na segunda metade do festejo.
    Fábio Caeiro esteve firme com o quarto, fechando-se com raça perante um toiro que não incomodou muito; Rúben Torrado teve pela frente um animal que saiu cedo e com a car humilhada, que o levou em viagem tranquila e sem reparos, recuando muito o forcado e o grupo a fechar todo já em terrenos de dentro; Marco Ramalho pegou o último e fechou a actuação do conjunto da Póvoa com uma pega segura ao primeiro intento, ainda que reunindo com mais decisão do que brilho.

    A pequena e castiça praça da Granja albergou cerca de dois terços de entrada (com predominância no sector da sombra), sendo a corrida abrilhantada de forma correcta pelo Sr. Agostinho Borges.

    Pedro Guerreiro