O Toiro foi a Salvaterra
Se é verdade que os olhos também
comem, então ontem de Salvaterra viemos saciados. Tendo em conta os tempos que
correm, ver um curro com a apresentação daquele de Vale Sorraia, já valia meio
bilhete.
Para não falar, e ainda que cada
qual com o seu feitio, que em comportamento transmitiram, levaram emoção às
bancadas, com raça e isso é o restante caminho para se passar bem a corrida.
E como esta corrida de domingo à
tarde era daquelas em que corríamos o risco de ver ‘toiro’ e não ‘cavalo’,
apenas meia casa se registou. E assim temos pena…de quem não foi!
António Telles deu-nos a
esperança para uma temporada muito inspirada da sua parte. Abriu corrida frente
ao primeiro, com 530 kg, um toiro que foi colaborador o suficiente para António
se exibir logo com três compridos corretamente deixados. Antes de dar sucessão
aos curtos, o cavaleiro da Torrinha mostrou que todo ele é uma verdadeira escola,
e um gosto de ver, na forma como brega e muda o toiro de terrenos, parando-o no
centro, para depois cravar o primeiro ferro curto com correcção. No segundo,
quis ir lá mais acima, o toiro apertou e ainda consentiu um toque. Cravou mais
dois ao terminar a lide que acabou por passar morna, principalmente se a compararmos
com a sua segunda actuação, que foi uma lição. Não só porque o toiro, com 490
kg, transmitia de verdade, metendo a cara cá em cima no momento das reuniões e se
arrancava com alegria ao cite, como também da parte do cavaleiro se sentiu mais
disposição, classe e arte. Montando o Alcochete, as sortes foram como nos
ensinam as regras, rectas, à cara e com verdade, e fica-nos aquele primeiro
curto, cingido, de alto a baixo, e como os livros de antigamente contam que
deve ser. Os que a ele se seguiram foram do mesmo registo, ainda que alguns
pequem pelo excesso de velocidade no momento da verdade.
Luís Rouxinol andou fiel a si
mesmo, com um conceito que agrada e é reconhecido sempre nas bancadas perante a
sua entrega em cada actuação. No primeiro, um toiro imponente com 600 kg, que
se revelou distraído e solto nas perseguições às montadas, Luís fez uso do
Ulisses para levar o toiro na brega, com os ladeios que fizeram soar os
primeiros aplausos fortes da tarde, a que se seguiu um bom primeiro curto.
Encurtou distâncias para deixar o segundo, consentiu uma passagem em falso
antes do terceiro, e começou-lhe a faltar toiro nas reuniões, o que retirou
alguma transmissão à ferragem. Rematou com um bom palmito. No segundo do seu
lote, um toiro com 470 kg e uma cornamenta que chegava para dar e vender, Luís
Rouxinol voltou a andar muito arrimado. Com o Douro nem sempre foi feliz na
ferragem com o primeiro comprido a resultar traseiro. Melhorou no outro que
deixou. Exibiu-se na forma como este cavalo leva embargado o toiro na garupa,
em ladeios que mais uma vez fizeram as delícias de quem assistia. Acusou um
toque após o primeiro ferro, de tanto que consente a montada ‘roçar-se’ no
toiro nos remates das sortes. Já com a Viajante vimos o melhor de Rouxinol ao
segundo ferro curto da sua lide. Partiu de tábuas, encurtou a distância e
perante um toiro tardo de investida, aguentou o suficiente para se sentir que a
égua tem um coração enorme. Ao estribo, de alto a baixo, cingido, como se quer
e gostamos de ver, assim foi ele! Deixou ainda outro mas ao qual, e depois
daquele segundo, já não vimos tão brilhante. Com o Antoñete rematou função,
deixando um palmito e o habitual par de bandarilhas.
António d’Almeida tinha todos os
motivos para se sentir apertado não com os toiros mas com as figuras com que
ombreava. Mas o jovem cavaleiro, e para quem não tem assim tantas
oportunidades, desenrascou-se! Frente ao primeiro do seu lote, animal com 625
kg, alto, imponente, há que salientar o momento da brega do bandarilheiro
Manuel dos Santos ‘Becas’, de verdadeiro toureiro, pela forma como recebeu o
toiro. António d’Almeida começou por acusar alguma pressão no início da lide,
consentindo passagens em falso para deixar os compridos, mas veio ganhando
confiança e virou o jogo. O toiro revelou apetência para a querença natural, e o
jovem cavaleiro logo mostrou empenho para o tirar das tábuas, dando-lhe boa
brega. Na ferragem, oscilou entre momentos de grande correcção na forma como
abordava o toiro, indo à cara do oponente e com alguns ferros a resultarem de
boa nota, com outros em que a sorte saíu mais atravessada. No último da tarde,
animal com 520 kg, António d’Almeida voltou a demonstrar grandes capacidades
para crescer como toureiro, numa actuação de menos a mais. Depois de dois
compridos e um curto menos cingidos, o jovem cavaleiro ainda se deixou apanhar
quando perdeu a ‘cara’ ao toiro durante o remate da sorte, procurando-o de um
lado e o toiro surpreendendo de outro. Caiu cavaleiro e montada e o toiro a
investir sem que o toureiro conseguisse dali sair. Valeu-lhe o ‘rabejador’ Luís
Rouxinol, sempre ao quite neste tipo de acontecimentos… Recomposto que estava,
o praticante arrimou-se em quiebros, destacando-se o terceiro, a curta
distâncias e que foi realmente impactante.
Nas pegas a emoção foi outra, com
bons desempenhos de ambos os Grupos.
Por Lisboa pegou nessa tarde, João Galamba
concretizou à segunda com o toiro a arrancar-se pronto, o forcado a recuar, a
reunir correctamente e o grupo coeso a consumar, depois de um primeiro intento em
que o toiro não estando fixo e se arrancou, derrotou alto e atirou o forcado
para fora; Daniel Batalha muito bem à segunda, numa pega rija, depois de na
primeira tentativa não ter reunido bem; e Martim Lopes à primeira, com o toiro
a levar a cara baixa toda a viagem.
Pelos Amadores de Salvaterra
pegou Nilton Milho à terceira a aguentar praticamente sozinho a viagem, e depois
de dois intentos em que num rodou na cara do toiro no momento da reunião, e no
segundo lhe faltou ajuda; Ruben Pratas consumou muito bem à primeira; e Luís
Carrilho fechou em grande a tarde, com um pegão perfeito do princípio ao fim.
Citou com calma, mostrou-se ao toiro, aguentou quase uma eternidade na cara do
animal até que este se arrancasse, e quando o fez, reuniu correctamente e
viajou sozinho até às tabuas, com uma alegria na pega que o toiro quase o meteu
dentro da trincheira.
Dirigiu a corrida sem problemas o
sr. Lourenço Luzio, assessorado pelo veterinário Miguel Matias. Foi concedida
volta ao representante da ganadaria, Manuel Telles, após a lide do quinto
toiro.