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    Rui Bento: "É da maior importância que continue a haver corridas de toiros no Campo Pequeno"


    O seu passado enquanto matador de toiros, as boas relações que criou no país vizinho, e alguns dos apoderamentos que estabeleceu, garantiram-lhe a importância e o profissionalismo num sector que, infelizmente, ainda subsiste muito do amadorismo. Foram essas qualidades, que o diferenciam de entre os seus pares, que fizeram dele o Homem escolhido para gerir em 2006 a primeira praça do país. Ali se mantém há 13 temporadas. 

    RUI BENTO VÁSQUEZ concedeu ao NATURALES uma entrevista na qual realiza um balanço do que foi a época 2019 em Lisboa, onde também fala da sua colaboração noutras praças, dos apoderamentos que assumiu este ano e até levanta um pouco o véu do futuro próximo.


    "Quem me conhece sabe que sou pessoa que gosta de aceitar desafios"

    Terminada que está mais uma temporada qual o balanço geral que faz da época 2019 no Campo Pequeno?

    Rui Bento: Em termos gerais, podemos dizer que a temporada de 2019 foi tão, ou mais desafiante ainda, que as precedentes. Desde o “Dia da Tauromaquia”, realizado em colaboração com a Prótoiro, a 23 de Fevereiro, à corrida a 23 de Agosto com três matadores de toiros portugueses (facto que não acontecia há 50 anos no Campo Pequeno), às várias efemérides e homenagens, aos triunfos aqui registados por artistas e ganaderos e ao regresso a Lisboa da Capeia Arraiana, foi uma temporada muito ecléctica. Nem tudo correu à medida dos nossos desejos. Ganhámos umas apostas e, noutras, reconhecemos que não fomos tão bem-sucedidos quanto o desejaríamos, mas a vida é assim mesmo, com altos e baixos. Chegámos ao final com uma lotação esgotada, na corrida de Gala à Antiga Portuguesa, a 10 de Outubro e com a sensação de dever cumprido, dentro de uma gestão racional, correndo riscos e sem cometer loucuras, do ponto de vista económico.

    A temporada de 2019 contou com 10 corridas, 1 novilhada e um espectáculo de Capeia Arraiana. Ainda é sustentável pensar-se uma temporada mais extensa ou acha que o caminho está em manter ou reduzir o número de espectáculos em Lisboa?

    Rui Bento: Temos indicadores de que registámos uma melhoria no que respeita a público presente. Apesar de menos um espectáculo que em 2018, o número médio de espectadores por corrida aumentou. Esse é um primeiro indicador. Outro indicador importante é o número de lugares de abono vendidos, cerca de 10% da lotação da praça, recorde estabelecido este ano. Cada temporada tem de ser pensada em função das expectativas de resultados económicos da exploração das corridas, da capacidade económica do público, da agenda cultural e desportiva (Campeonatos Mundial e Europeu de Futebol, Jogos Olímpicos, por exemplo) …enfim, um sem número de variáveis a que não podemos também deixar de associar o momento de forte contestação política ao espectáculo. Manter o número de corridas no Campo Pequeno, de momento, já seria bom…

    Falou de várias efemérides e homenagens que se viveram esta temporada em Lisboa. Considera isso também um dos pontos fundamentais para o sucesso de um espectáculo? Que cada corrida esteja associada a um acontecimento?

    Rui Bento: Associar efemérides às corridas, pelo simples facto de associar, não só não é fundamental, como no limite, até poderia ser um factor criador de menos-valias para o espectáculo. Contudo, nas efemérides que temos comemorado, ao longo destas 14 temporadas, procurámos sempre que essas efemérides correspondessem a momentos relevantes para a história da tauromaquia, ou do Campo Pequeno. Não poderíamos deixar passar em claro a homenagem, ao Maestro Joaquim Bastinhas, como não podíamos esquecer as Bodas de Diamante do Grupo de Forcados Amadores de Lisboa, ou os aficionados da Região Autónoma dos Açores. Por outro lado, cada corrida é um acontecimento em si, potencializado por um ou outro acontecimento. Aliás, todas ou quase todas as corridas no Campo Pequeno estão habitualmente ligadas a um acontecimento, quer seja uma estreia ou outro acontecimento como os que exemplifiquei há pouco. É uma forma de criar expectativa nos aficionados mais jovens e de recordar memórias com os aficionados mais antigos.

    E por Lisboa, em 2019, passaram praticamente todos os principais artistas portugueses do toureio a cavalo. Faltou alguém que quisesse mesmo ter trazido a Lisboa e que não conseguisse em 2019?

    Rui Bento: Portugueses…, pode sempre argumentar-se que faltou este, ou que aquele esteve a mais. Nunca haverá consenso sobre uma matéria tão subjectiva. Contudo, concordo que os principais estiveram no Campo Pequeno. Gostaria de ter podido dar mais oportunidades aos jovens. Mesmo assim, as que proporcionámos, entendo que foram bem aproveitadas. Em termos internacionais, naturalmente que faltou Diego Ventura. Não houve acordo de condições para que ele toureasse no Campo Pequeno. Oxalá se concretize em breve, pois esse é o desejo de ambas as partes.

    No campo ganadero, houve toiros para todos os gostos. Repetiram-se algumas ganadarias, debutaram outras... Neste sector como avalia a temporada em Lisboa?

    Rui Bento: Penso que o capítulo de ganadarias foi particularmente bem-sucedido. Repetimos ganadarias que triunfaram em Lisboa, em 2018, como foi o caso dos “Silva”, dos “Grave” e dos “Veiga Teixeira”. Estreámos as de Calejo Pires, uma corrida muito forte de apresentação e Brito de Paes, uma corrida que resultou excelente. Jorge de Carvalho lidou pela primeira vez uma corrida completa em Lisboa. Passanha, Romão Tenório e Varela Crujo estiveram a bom nível. A de Pinto Barreiros, apesar de um tanto terciada, investiu com a raça a que nos tem habituado.

    Os ganaderos Jorge Carvalho (11 de Julho) e Brito Paes (10 de Outubro) foram premiados com volta à arena, acontecendo o mesmo com os representantes das ganadarias António Silva (11 de Abril), Varela Crujo (6 de Junho) e Veiga Teixeira (8 de Agosto), ao passo que a de Pinto Barreiros teve chamada do seu representante à arena (27 de Setembro).

    Um dos espectáculos que consideramos mais marcante deste abono foi a corrida de toiros só com 3 matadores portugueses. Foi preciso coragem para levar avante um espectáculo desses num país em que escasseiam os apoios aos matadores e novilheiros lusos?

    Rui Bento: Coragem e valor tiveram os três matadores para enfrentarem a corrida de Calejo Pires, uma corrida pesada. Da parte da empresa houve uma aposta grande, numa corrida cujo cartel tinha uma estrutura como não se via há meio século em Lisboa: Três Matadores de Toiros portugueses em competição. Três Matadores de Toiros, qualquer deles em condições de tourear em Madrid, ou em qualquer outra praça do mundo e de se baterem de igual para igual com as figuras de Espanha. António João Ferreira, que viria a ser colhido nessa corrida, com uma certa gravidade, Nuno Casquinha com triunfos sucessivos no Peru e “Juanito”, o mais recente Matador e Toiros português, dignificaram na arena o bom nome dos Matadores de Toiros portugueses.

    O público não correspondeu, o que nos leva a, mais uma vez enquanto empresa, a reflectir no risco de promover corridas com este tipo de cartéis. Certos aficionados reclamam por mais toureio a pé e quando têm a oportunidade de desfrutar e apoiar uma corrida dessas, não aparecem. Ora há aqui, no mínimo, falta de coerência da parte desses aficionados. A empresa cumpriu mais uma vez com o seu propósito de promover o toureio a pé mas, dada a pouca adesão de público, é algo que constitui tema de reflexão atenta.

    Mas consegue arranjar alguma explicação para essa falta de público quando tantos se dizem aficionados ao toureio a pé e reclamam festejos com essa vertente do toureio a pé em Portugal?

    Rui Bento: Melhor perguntar aos aficionados. Da nossa parte, pusemos todo o empenho para que as coisas resultassem. E no plano artístico resultaram mesmo.

    Então não será um tipo de espectáculo para voltar a arriscar numa próxima temporada?

    Rui Bento: Com três matadores de toiros portugueses quebrámos o “jejum” de 50 anos. Não fomos bem-sucedidos. Em 2007, na mini-feira de Lisboa, com um cartel composto por Enrique Ponce, Julián López “El Juli” e José Luís Gonçalves, vendemos 48% dos bilhetes. Em 2016, com “Finito de Córdoba”, “Padilla” e Manuel Dias Gomes, registámos uma boa casa. Com este histórico…

    O Rui é desde a reabertura da praça, em 2006, o gestor das actividades taurinas do Campo Pequeno. O que, ao longo destes anos, tem vindo a melhorar e a piorar na sua opinião na organização das temporadas de Lisboa?

    Rui Bento: Numa organização haverá sempre algo que se poderá melhorar e também algo que, se não for bem cuidado, pode, de um momento para o outro, comprometer o nosso trabalho. Na minha óptica, um dos pontos fortes do Campo Pequeno tem sido a capacidade de apresentar cartéis com composição heterogénea quanto a idades e estilos dos intervenientes mas, ao mesmo tempo complementares, no sentido em que temos conseguido satisfazer, ao longo da temporada, as várias sensibilidades dos aficionados, fazendo competir veteranos com jovens, clássicos com modernos, bem como alargado a presença ao maior número possível de grupos de forcados. O toiro é um elemento ao qual a empresa presta a maior atenção, pelo tipo e diversidade das características das ganadarias apresentadas que variam numa escala que tem por limites as mais “touristas” e as mais “toureiristas”. Temos registado vários e importantes triunfos ganaderos ao longo destas 14 temporadas. Todavia, reconhecemos que, durante este período, houve duas ou três datas em que o elemento toiro falhou totalmente, como em devido momento, assumimos.

    O bom trabalho feito em Lisboa tem tido impacto ao ponto de ano após ano, ser "requisitado" para coadjuvar noutras praças. Como aconteceu em Almeirim e Nazaré. Que balanço faz da temporada nestas praças?

    Rui Bento: O meu envolvimento empresarial é com as praças de Almeirim e da Nazaré, na qualidade de Consultor. Almeirim reabriu este ano, depois de uma intervenção com o objectivo de a recuperar e reabilitar. Os três espectáculos que ali se promoveram, duas corridas à portuguesa e um de recortadores tiveram excelente moldura de público e foram uma aposta ganha. Quanto à Nazaré, conseguimos uma temporada muito interessante e com um acentuado crescimento do número de espectadores, qualidade e diversidade de cartéis. Em qualquer dos casos poderemos ainda melhorar substancialmente, mas, para já, são duas apostas ganhas.

    E é para manter em 2020 a sua presença nas mesmas ou até acrescentar mais tauródromos à lista sob sua gestão? Fala-se por exemplo em Reguengos...

    Rui Bento: Quem me conhece sabe que sou pessoa que gosta de aceitar desafios. Portanto, estou aqui para analisar eventuais oportunidades que se perfilem, dependendo sempre do que venha a acontecer no Campo Pequeno.

    Em 2019, o Rui reforçou a sua vertente de apoderado, e a par do cavaleiro João Moura Jr., acrescentou à equipa Luís Rouxinol, pai e filho. Que análise faz desses 3 apoderamentos e estas relações são para manter em 2020?

    Rui Bento: São relações de apoderamento para manter, sim senhora. Tratam-se de três cavaleiros de enorme categoria. Moura Jr. e Rouxinol pai, com créditos firmados, dois triunfadores indispensáveis em qualquer cartaz da máxima categoria. O Rouxinol Júnior tem um potencial artístico imenso que, nesta temporada já explodiu, apesar de continuar com grande margem de progressão. Repare que tem apenas duas temporadas de alternativa... São três profissionais admiráveis e três pessoas do melhor. Há inteira concordância dos três com as estratégias de carreira que delineei para cada um deles. Juntamente com as respectivas quadrilhas e restantes elementos dos staffs, constituímos uma grande equipa.

    Sem se aprofundar muitos, factos e certezas que já possam existir sobre o futuro do Campo Pequeno, mas o que poderá dizer para descansar ou não, os aficionados sobre a continuidade da Tauromaquia em Lisboa com esta nova concessão?

    Rui Bento: De momento, muito pouco. Apelo apenas aos profissionais do toureio, aos aficionados e público taurino em geral, para o facto de ser da maior importância que continue a haver corridas de toiros no Campo Pequeno, pois a tauromaquia está no ADN do edifício. Vamos, pois, aguardar serenamente.

    E no geral, como vê actualmente e a curto espaço, o ambiente taurino em Portugal?

    Rui Bento: Com enorme preocupação, pois a ofensiva nacional e internacional contra as corridas de toiros não só continua, como se adensa e torna cada dia mais evidente, estruturada e aguerrida. Preocupa-me a passividade com que os profissionais do toureio, os aficionados e, de um modo geral, os diversos sectores que dependem da festa, encaram o actual momento. Realço aqui o trabalho da Prótoiro na defesa do espectáculo e tradição tauromáquica. É um trabalho de insistência e persistência que se desenvolve discretamente nos bastidores dos diversos centros de decisão política com relevo para a tauromaquia. Mas este trabalho tem de ser apoiado por todos nós, em acções de afirmação do nosso querer, da nossa vontade em não renegarmos o nosso passado, nem a nossa cultura.