Crónica de Vila Franca: “De “A” a “V”…de vitória”
Vitória da Festa dos Toiros, de Vila
Franca de Xira, do Toureio a Cavalo à Portuguesa, vitória de… António Ribeiro Telles!
Uma das mais aguardadas noites desta
temporada realizou-se ontem na centenária praça de toiros Palha Blanco com uma casa esgotada, enorme ambiente e grande
expectativa.
O “confronto” apresentado entre
dois ícones do Toureio a Cavalo criou nos aficionados a máxima ilusão e em
muitos deles também a certeza de que um, dada a sua jovialidade, a variedade e
qualidade das suas montadas, iria ‘abafar’ o outro. Puro engano…
Na Tauromaquia nem sempre 1+1 é
igual a 2… já que a incerteza do comportamento dos toiros, da disposição dos
cavalos e até da ‘cabeça’ dos toureiros pode influenciar o resultado final. Nem
tão pouco se pode fazer comparações ou querer superiorizar uma de duas Figuras
de estilos distintos e créditos mais que firmados.
Contudo, houve nesta noite de “mano-a-mano”
a clareza de como o Toureio a Cavalo à
Portuguesa ainda “manda nisto tudo” e consegue levantar e emocionar bancadas.
Sem números, sem invenções, de ‘frente ao estribo’ e sem mais!
Para dois toureiros de conceitos
próprios, três ganadarias distintas: Prudêncio
da Silva, Palha e Cortes Moura.
Os dois de Prudêncio foram
díspares de comportamento e apresentação. Se o primeiro foi bonito e enraçado,
o segundo foi avacado, manso e a complicar. Os ‘Palhas’ tiveram comportamento
similar sendo manso a descair para tábuas o primeiro, a doer-se a lide inteira,
mais cómodo o segundo mas a deixar-se sem problemas. Os de “Cortes Moura” foram
o típico do encaste murube, nobres, perseguindo a passo cadenciado, com mais ‘gás’
o primeiro e uma irmã de caridade o segundo e último da corrida.
António Ribeiro Telles, o mais clássico e fiel protagonista do
Toureio a Cavalo à Portuguesa, foi claramente o mais destacado ginete da
corrida. Pese embora as suas três actuações terem sido todas elas de menos a
mais, com momentos intermitentes na primeira e segunda, António apresentou
argumentos mais que válidos nas três lides e para os três toiros teve ofício. Possivelmente,
o cavaleiro da Torrinha entrou naquela praça, que lhe é tão familiar,
consciente de que seria noite de tudo ou nada, e no final ficou a certeza: foi
de tudo! Porque quis, porque se impôs e ao seu terceiro toiro António Ribeiro
Telles parecia que toureava apenas para si, desfrutou e fez desfrutar.
Frente ao ‘prudêncio’ não foi
consistente nos compridos, ganhando confiança aos poucos nos primeiros curtos.
Mas foi com o Veneno que a lide ganhou mais sitio e iniciou a escrita de uma
página importante da sua carreira. No segundo, o de Palha, esperou-o à porta
dos sustos mas este revelou-se desinteressado. Montando o Alcochete permitiu
algumas passagens em falso e teve que se redobrar de atenções ao toiro que lhe
exigiu mais cuidado. Ao quarto curto, entrou de verdade pelo toiro adentro, assim
como no quinto e no sexto, e ficou rubricada mais uma actuação de mérito. E se
dúvidas ainda houvessem naquela noite, foi no quinto toiro que António Telles
foi simplesmente António. Recebeu o ‘cortes moura’ com uma sorte gaiola bem
conseguida mas foi depois nos curtos, e com o Favorito, que António confirmou a
noite grande que viveu e fez viver. Sempre ligado no toiro, dando a cara e
inclusive recreando-se na brega com que levava o toiro para os terrenos certos,
deixou os três últimos curtos desta actuação como mandam as regras e levantou
todos dos seus assentos! Que ambiente! Que verdade tem o toureio de António
Telles! Duas voltas deu nessa sua última actuação. Ficou a faltar uma saída em
ombros! Mas o mérito, o triunfo, a vitória, esses já ninguém lhe tira!
O luso-espanhol Diego Ventura é, no momento, o mais seguro
promotor do Rejoneio, senhor de um estatuto de Figura Mundial, de mérito e
valor! Mas nem sempre se soube impor nesta noite na Palha Blanco. Frente ao ‘prudêncio’
teve actuação irregular, consentido alguns toques nas montadas, ferros de
reuniões desajustadas, perante uma rês mansa, a procurar refúgio mas com
arrancadas bruscas e inesperadas. Não lhe foi concedida volta. Frente ao “palha”
e montando o Nazari demonstrou mais preocupação na brega, com um toureio de
cercanias e empolgou as bancadas quando com o Gitano partiu dando a cara ao
toiro para no último momento, sair pela direita e cravar dois violinos. O
rejoneador não quis dar volta apesar de autorizada. No entanto, foi na última
lide que Ventura se aproximou mais do nível que lhe é conhecido. O toiro de
Guiomar Cortes Moura também foi mais ao seu gosto, cómodo com mobilidade,
perseguindo a passo e frente ao qual o rejoneador se exibiu maioritariamente
com ferros com batidas pronunciadas. Deixou a Palha Blanco em estado de sítio,
quando retirou a cabeçada ao Dolar e cravou dois pares de bandarilhas. Deu uma
volta, aínda lhe pediram a segunda mas Ventura não quis.
Noite grande foi também a dos Amadores de Vila Franca que escreveram
mais uma página da sua História com a mudança de cabo. E foi Ricardo Castelo,
que se despedia, quem deu o mote com uma grande pega ao primeiro intento; o
novo cabo Vasco Pereira aguentou
a violência de um forte derrote ao primeiro intento, e valente, consumou à
quarta com boa primeira ajuda; Francisco
Faria efectivou à primeira tentativa com o Grupo a ajudar com decisão; David Moreira também à primeira
teve enormes braços para aguentar a reunião; Márcio Francisco à segunda consumou uma pega rija; e Rui Godinho fechou com chave de
ouro à primeira tentativa uma boa pega. Ressalvar a emotiva despedida e
passagem de testemunho de Ricardo Castelo a Vasco Pereira.
Mas se há nota a acrescentar a
esta crónica, foi a notória exigência do público de Vila Franca que, partidário
ou não de um ou de outro artista soube equilibrar as coisas. Apesar de existir
sempre quem para vestir a camisola, necessita desapreciar o alternante, a
maioria do público presente foi justo! E da mesma forma que assobiaram os peões
de brega de Ventura quando este num lado da arena, aguardava que lhe colocassem
o toiro no lado oposto, também assobiaram os ‘de prata’ de António, quando se
atreviam a intervir em demasia. De igual forma, vibraram tanto com os ferros do
António, como com a exuberância de Ventura ou com o valor dos Forcados.
Dirigiu a corrida o sr. Pedro Reinhadt, assessorado pel o Dr. José Manuel Lourenço.
De “A” de António, a “V” de
Ventura…a real Vitória foi sem dúvida, de quem assistiu a esta corrida para
memória futura.
Por: Patrícia Sardinha