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    Crónica de São Manços - Um par de ferros para contrariar o dia...


    A data era propícia aos acontecimentos do quotidiano e que se verificam neste meio... afinal de contas, dia 1 de Abril, é dia das mentiras, e em tempos como estes, a dúvida é apenas uma: em que dias se celebram a verdade?

    Não querendo transparecer amargura nas minhas amêndoas da Páscoa, a verdade é que as que nos foram dadas em São Manços até à saída do sexto toiro não passaram de uma degustação com receita aldrabada, ou em alguns casos, não tão clarividente como podia ter sido.

    Mas após esta analogia, quiçá num tom demasiado inquietante e frustrante, apetece (contra)dizer-me e enaltecendo que houve detalhes, pequenas coisas aqui e ali que valeram pela tarde... e a porta gaiola de Rouxinol Júnior foi esclarecedora para poder utilizar estas últimas palavras. 

    Haviam passado quase três horas, ainda não tínhamos passado do meio-termo nem de uma palpitação regular e tranquila, até que o jovem Rouxinol mandasse recolher os peões de brega e se perfilasse em frente à porta dos curros para com um portentoso (e muito bem cravado, diga-se) ferro, reclamar para si, a atenção e emoções dos público que preencheu em cerca de 3/4 a praça de Toiros de São Manços.

    A corrida, Concurso de Ganadarias, abriu com um toiro de Fernandes de Castro. Animal de pelagem negra, quatro anos, alto mas curto e compacto, com presença e uma cara bem posta que lhe outorgava trapio e por isso, enganadores os seus 530Kg. 
    Era toiro para triunfo. Nobre, com falta de classe, era fixo e andava sempre ligado sem que fosse necessário captar-lhe atenção, não encontrando entraves na hora de perseguir nas viagens e até posteriormente às reuniões, nas quais se empregava mais quando sentia o ferro. Pareceu-me algo desequilibrado nos quartos traseiros e no capote não foi claro, mostrando-se várias vezes rebrincado. 
    Francisco Palha não foi seu aliado, inclusive se sentiu mais toiro que toureiro. Várias passagens em falso, alguns toques, e um entendimento que não chegou a dar-se, esforçando-se no final para contrariar um desfecho negativo mas foi insuficiente. 

    De Jorge Carvalho foi o segundo da tarde, animal baixo, comprido e com algum aparato morfológico. Quatro anos e 580Kg, de cara feia e mal feita, não tinha um tipo agradável e acabou por revelar-se isso no seu comportamento. Disperso, andava a passo e media com alguma frequência, querendo passar-se por manso encastadito mas a casta não passava de um pequeno picante que só molestava se houvesse consentimento.
    Miguel Moura mostrou intenção mas pecou por irregularidade, nem sempre caprichando o necessário para manter estabilidade na sua prestação. Nem sempre houve coerência na eleição dos terrenos, e os ataques de praça a praça (com o toiro a responder apenas no pré-embroque), era o que mais calava nos tendidos, porque em termos de conteúdo na ferragem, houve alguma intermitência, tal como toques nas montadas. 

    A fechar a primeira parte saiu um toiro com as marcas da Herdade do Pedrógão, solar da ganadaria Veiga Teixeira. Toiro cuajado, sério, com cinco anos e 620Kg. De cara larga e aberta, cornalón, curto de mãos e empregando-se com casta no capote, faltando-lhe empuje e mais humilhação. Foi um toiro com vários estados, e por isso, de difícil e clara definição, oscilando entre as vezes que acometeu em perseguições enraçadas e vibrantes, com outras em que se defendia (doendo-se algumas vezes) e se tapava às abordagens do toureiro, pedindo sempre atenção e ideias claras ao seu opositor. 
    Luís Rouxinol Jr. tardou a ganhar-lhe sítio, mostrando intenção nos compridos ainda que tenham resultado diminuídos devido à colocação. Os curtos começaram como se de forma palpável e pouco confiada, com apenas o penúltimo a revelar melhor intenção e este sim, melhor concretização em relação aos anteriores. 

    Um castanho de Canas Vigouroux abriu a segunda metade do curso. Ainda que com 600Kg, o seu esqueleto não o fez parecer atacado, com cara nada ofensiva mas com pouco brilho. Foi algo fácil e só pedia que o provocassem e se mantivessem sempre com ele, para que não se aborrecera e desligara. Tranqueou de forma candenciada e faltou-lhe um pouco de ritmo e principalmente transmissão às suas investidas, muitas vezes tardas e amorfas, mas que ainda assim, apontavam classe. Poderia e deveria ter transcendido Francisco Palha, mas não passou de benevolente. O Canas, atacado com ganas, respondia e cedia, e foi isso que se notou mais em falta à actuação de Francisco. Preocupou-se com o desenho das sortes, e na sua maioria logrou positividade a cobrá-las, mas faltou alegria e transmissão por parte dos dois. 

    Da Histórica Adema foi o quinto. 
    O Palha, negro e com quatro anos, com 470Kg, tinha uma cara bonita e bem feita, bem armado, era pequenote mas tinha raça. No capote meteu as mãos por diante e era ofensivo a colocar a cara (nas viagens fê-lo sempre tentando olhar o cavalo nos olhos, denotando altivez), e carregava quando sentia espaço. A lide de Miguel Moura passou sem dar-se por ela, não se sentido conexão entre toiro e toureiro. As viagens são equacionadas com intenção, há sentido e vontade, mas chegou aos momentos da reunião e é como se houvessem filtros a tirar cor e vida à cravagem, com apenas o terceiro, em que logrou equilíbrio, a merecer realce.

    O Cunhal Patrício que estava encarregue de culminar o Concurso de Ganadarias foi feito parecer melhor do que realmente foi... Deparou-se com uma atitude louvável (e necessária) de Rouxinol Jr. que o esperou no centro da arena para cravar o ferro da corrida, numa gaiola que foi um portento. 
    Acusou na báscula 550Kg, tinha uma carita torera e era bem medido em termos de conformação física. 
    Mostrava boas intenções no capote e até chegou a colocar bem a cara; de saída, acometeu móvel e com pata a montada, aguentando-se o cavaleiro com ele e realçando-lhe a transmissão que ostentou ao início. Passou várias momentos a passo e com pouco interesse nos médios, mas a chave para lhe dar condição foram os tempos e motivação por parte de Rouxinol Jr, que fez questão de lhe dar vida sempre que a chama parecia acabar. 
    A derradeira prestação da tarde acabou por ser a mais consistente e com melhores resultados qualitativos. 
    Se nos compridos convenceu com mérito, os curtos, montando o Amoroso, foram uma sucessão de superação, sempre subindo paulatinamente: atenção do toiro captada, cite iniciado, alegrar a investida, partir recto e escapar ao milímetro com o momento da jurisdição a tornar-se sempre mais cingido ferro após ferro, três dos quais de exímia execução, com especial destaque para o quarto, em que soltou a mãos das rédias e cravou com som perante uma investida mais encastada. Houve sintonia e resultou.

    Grupos vizinhos encontraram-se mais uma vez para pegar a corrida do domingo de Páscoa em São Manços, com os da casa a reclamar para si os melhores momentos da corrida. 

    Pelo Grupo de Évora, João Madeira teve tarefa ingrata com o Castro, que no momento da reunião mudava a trajectória derrotando com o pitón direito. À quarta, em que meteu a cara mais franco, forcado e grupo conseguiram fechar; Miguel Direito custou a fechar-se ao derrote seco e incomodativo do Teixeira, notando-se alguma falta de prontidão dos ajudas nas duas primeiras tentativas. No terceiro encontro consumou; Ricardo Sousa aguentou bem os derrotes altos (ainda que pouco incomodativos) do Palha e consumou com eficácia na primeira tentativa.

    Rui Pelado, pelos Amadores de São Manços, consumou uma grande pega à primeira tentativa, com o animal do Eng. Jorge Carvalho a sair com muita pata e outorgar uma viagem longa e a pedir forcado com braços e grupo coeso; Jorge Valadas esteve correcto e decidido, que era o que pedia o toiro, e consumou bem à primeira tentativa; a investida do Cunhal Patrício na pega foi sempre por baixo e a causar dificuldade para o forcado se fechar bem. O cabo João Fortunato prontificou-se para a cara e à segunda entendeu-se com ele, sendo o grupo fulcral para consolidar os derrotes já em tábuas.

    O júri do Concurso, para além de contar com a minha participação, foi composto por Miguel Ortega e Joaquim Branco, e decidiu outorgar o prémio Bravura ao Toiro de Cunhal Patrício e o de Apresentação ao Toiros de Fernandes de Castro. 

    Dirigiu a corrida o Sr. Agostinho Borges, sem problemas de maior ou situações a registar, sendo apenas de realçar alguns comportamentos indevidos e perturbadores por parte de alguns espectadores.

    Em suma, mesmo no dia das mentiras, a verdade será sempre a verdade, e é tão distinta quando é sentida...

    Pedro Guerreiro