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    Crónica de Santarém - Uma espécie de Gin tónico, sem gin e sem tónica


    Era 10 de Junho, um sábado Dia de Portugal, portanto. Era 10 de Junho, em Santarém, na Celestino Graça. Inegavelmente, uma das datas mais fortes de todo o historial taurino.

    Era 10 de Junho, e soava o cornetim, sensivelmente dentro das seis horas da tarde, para que entre tagarelice, um gin tónico e 30ºc rompessem em cortesias os actuantes. 
    Gin tónico, olhó gin...! soava como um eco naquela bancada. De fundo, uma mescla ibérica de sons, aromatizados por meia dúzia de puros que me faziam fechar olhos e imaginar Sevilha, Madrid... Mas apercebia-me que a conotação tendia mais a Aracena, Borox ou Villanueva del Fresno. Aos que não interpretem, de pueblo, portanto. 

    Fiquei surpreso, e se tivesse Camões boa vista aposto que também, com a afluência verificada. Era 10 de Junho. 
    Não sei se dois terços, se meia forte, se três quartos. Havia disparidade, e somente a sombra se aparentava arrobada. 

    Não vou utilizar a expressão que diz que as tardes de maior expectação são as de maior... Não! Prefiro que se mantenha num ponto em que podia ser considerado o requinte do cartel: Gin.
    Um bom old english, com uma tónica de referência, prometia o cartel. Mas no final de contas não bebi nenhum, e havia um copo meio cheio (ou meio vazio)... mas de gin não lhe senti o paladar. Adiante...


    Seis de seis. Seis mansos. 
    Os dois toiros de Guiomar Cortes Moura, ambos bem apresentados, cara medida e ajustada à exigência da Celestino Graça, foram bobos, sem poder, nulos de raça e a carecer de motor e entrega, incluindo-se várias estirpes de manso, mais evidenciadas no lidado em quarto lugar.
    De Salamanca e de Vejer de la Frontera, vieram quatro animais com os ferros Garcigrande e Núñez del Cuvillo. 
    As caras larocas do costume, e vou perdendo a vontade de dar benesses, mas para além de fofos (fofinhos!), nulos de casta, sem fundo, flojitos e mansos. 
    Apesar de serem duas ganadarias cotadas e de mérito, ambas pecaram em quase todos os aspectos. 
    Lamentável.


    Com a moral em alta e a disposição do costume, apresentou-se Diego Ventura em praça.
    O primeiro Guiomar, com 580Kg, negro mulato, foi algo pegajoso de início, com pouca vontade e uma enfandonha e parca condição a vir a menos.
    Ventura dobrou-se com ele nos médios, deu-lhe espaço e o segundo comprido foi o melhor. Montando o Nazarí, brega a duas pistas com qualidade, sendo escusável o abuso das mãos nas rédias. 
    Tentando imprimir solvência, diga-se, de forma regular e algo discreta, o que porfiou Ventura para reavivar o (cada vez mais a menos) manso, não foi suficiente para a transcendência esperada e pretendida. A terceira bandarilha foi conseguida, e a penúltima, com o toiro em tábuas e a agravar a característica tardia da sua investida, aguentando o cavaleiro  para quebrar a investida num palmo de terreno e cravar com som. 
    O quarto, que se rachou mais cedo, não foi cúmplice do labor do rejoneador.
    Fez gala dos recursos de Sueño, e foi inteligente nas abordagens ao toiro, que a favor da crença e em movimentos para dentro se sentia provocado. 
    Sinfonia entre ambos, e com o toiro a vir a chouto, recuava até não poder mais para cobrar, quase sempre faltando toiro para outorgar o ajuste e o acople que várias vezes se procurou, mas que tardou em aparecer. Num dos momentos pareceu impossível a forma como se esquivou o cavalo da investida do seu oponente, cravando o melhor ferro da sua prestação, com a cara do toiro a vir ao peito do equino e com o morrillo debaixo do braço, cravou e saiu de forma limpa. No que restou da prestação, houve falta de regularidade nos argumentos, e mais toiro para se sobrevalorizar o que faz.


    De Cuvillo foi segundo da tarde. Um inválido, flojito desde a sua saída, pouco manejável e totalmente vazio de conteúdo. Duas chicuelinas, um trincherazo e Morante a ser Morante. Um suspiro. Bronca. Séria e audível. 
    O jabonero sucio, também ele da divisa tricolor, metia-se com vontade nos enganos, desplazava nas saídas e a meio das viagens levantava a cara. Sem classe e sem tranco, a sua inércia outorgou dois derechazos, mas com ofício de figura, podia (devia) haver mais.
    Morante, irreconhecível e decepcionante com o capote, não quis vê-lo na muleta. O desempenho dos seus bandarilheiros foi aquém, e o tratamento dado ao animal deixou a desejar. O lado direito podia ter coisas a despejar, mas não... Pelo esquerdo houve uma pseudo-tentativa, mas a nulidade dos recursos foi um bom-bom para a disposição e perceptibilidade do toureiro. Petardo, desilusão, decepção, tudo mais... para quê? Morante em Morante. Como quando está bem, está em Morante, como só ele. Mas hoje foi indigno, triste e revoltante. Nem lhe valeu o seu venusto. 


    Tarde de lírica de Julián López. Goste-se mais, goste-se menos, ninguém pode, nem deve pedir mais.

    O toiro de Justo Hernández que saiu em terceiro lugar, sem chispa, desclasado e carecer de recorrido e empuje, resultou maleável nas mãos de El Juli. 
    De capote houve duas verónicas templadas e a gosto, com três medias a ralentí de remate. 
    A prestação da quadrilha de El Juli, à semelhança da do toureiro de la Puebla, foi fraca e sem condução objectiva. 
    Em prol do toiro, Julián foi sacando o que não havia, perdendo passos quando necessário, e abrindo-lhe o caminho sem se enroscar em demasia, não agravando as matizes de bobalicón do animal, que passou mais vezes sem selo do que quis investir na realidade. 
    Colocado, cruzando-se e acertando na medida dos toques para o potenciar, começou a romper pela direita, ajustando-se e vaciando duas séries importantes, marcadas pelo cuajo que patenteia o Juli que se tem vislumbrado em 2017.
    Por dosantinas recriou-se e conectou, e com luquesinas criou novo júbilo, rematando uma faena meritória, carecendo somente de uma série mais consistente pela esquerda. 
    O sexto foi a nódoa (a mais visível). Algo montado, o colorao ojo de perdiz com o ferro de Garcigrande, luzia um perfil de novilho amorfo, lavadito de cara e manso de livro. 
    Juli, em profissional, não só o tragou nas suas intenções, como aqui e ali sacou naturais pintureros que efervesceram de novo nos tendidos. 
    Andou meia praça a sacar-lhe cabezazos, e no final, o público, tributou-lhe uma merecida e respeitada ovação.


    Os Amadores de Santarém foram os responsáveis pelas duas pegas da tarde.

    Francisco Graciosa esteve correcto a citar perante um toiro sem franqueza e com uma investida chata, consumando pega ao terceiro intento e com melhor desempenho por parte dos ajudas, até aí com relativa demora no auxílio ao companheiro. 

    Luís Seabra sem reparos e com facilidade, fechou-se bem e o toiro não ocasionou problemas, concretizando no primeiro encontro.

    Dirigiu a corrida o Sr. Lourenço Luzio, abrilhantada, de forma excelente, pela Banda de Alcochete.

    O cartel saiu à rua, e o que se augurava, é o que se augura quando se espera beber um bom gin;
    Apreciar um bom gin não estará ao nível de todos, nem apreciar as particularidades de uma boa tónica;
    A não ser que seja um daqueles rasca, que todos reconhecem como mau... E desses, tantas vezes que nos vendem por aí, nem gin, nem tónica têm. 
    Se podemos fazer um paralelismo destes e interligar os dois temas...? Se o Morante pode ser Morante, eu posso ser eu...

    Pedro Guerreiro