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    Crónica da Corrida RTP: "Os alentejanos, a seriedade...e o ferro!"


    Num país das touradas, onde durante grande parte da temporada nos é imposta a vulgaridade, a repetição, a bajulação, a troca de favores e interesses pessoais, e onde a gritante falta de afición nos apresenta cartéis sem nexo, alguns sendo cópias uns dos outros, ‘salve’ se faça às (boas) excepções! 

    É que quando existe cuidado e seriedade na escolha de uma corrida, resulta bom para todos: empresários, intervenientes e aficionados, mas é ainda melhor quando para além da seriedade, existe Toiro! 


    Na passada quinta-feira, a corrida realizada na Praça de Toiros do Campo Pequeno, foi daquelas à antiga, das que criam aficionados na praça ou sentados em casa a fazer serão em frente ao televisor! 

    A culpa? 

    De quem montou o cartel, do curro saído à praça e da vontade gigante dos artistas que intervieram! 

    Dizer-vos que o curro de Murteira Grave foi perfeito ou digno dos céus? Não! 
    Deixai-os estar antes em Galeana que é onde eles se criam bem.


    Mas recordar-vos, pois tiveram como eu oportunidade de os ver certamente na praça ou pela TV, que estes foram toiros para toureiros à séria, isso eu lembro-vos as vezes que forem necessárias! 

    E talvez tenha sido por isso mesmo, que este preciso curro levou "nega" de um artista para abrir a temporada deste ano em Lisboa, tendo-se optado e em alternativa, que fossem antes lidados nesta televisionada e sem quem os negou incluído no cartel. 

    Em boa hora isso aconteceu! 

    Quiçá se o cartel pensado para os "Graves" em Maio se tivesse mantido, não teriam saído os toiros com o mesmo comportamento que saíram na quinta-feira. 

    Diz-se mas desminto, e com toda a legitimidade o faço, que os alentejanos são lentos, preguiçosos... Pois que, mais provado ficou quinta-feira, que se houve coisa que não faltou aos "alentejanos" que saíram à arena, foi raça, transmissão e mobilidade! 

    Toiros que pediram contas e cavaleiros que souberam somar e subtrair com eles, longe das babosas, do toiro ‘nhoc-nhoc’ qual boi da corda que se limita a perseguir sem emoção e onde a habilidade do cavalo é amplificada pela pobre condição do toiro.

    Os de Murteira Grave nesta noite saíram bem apresentados, sem caírem no logro do "boi pesado", bonitos, de várias capas e com comportamentos distintos mas a transmitirem todos emoção, raça, codiciosos, alguns bravos e com classe, tudo o que vai faltando nas nossas praças.

    E por mais bravos que eles até pudessem ser, não fossem também os três toureiros que tiveram pela frente, muito poderia ter ficado por ver nessa noite. 

    António Ribeiro Telles foi a perfeição do toureio clássico na sua primeira actuação. Do princípio ao fim, a sua lide foi de uma correcção e sabedoria frente ao mais pesado da noite, com 640 kg, nobre e de muita entrega na perseguição às montadas, sendo mais tardo a partir aos cites do cavaleiro. Montando o Veneno, António foi eficiente e superior em todos os detalhes, com abordagens rectas e ferros ao estribo, onde o quarto curto foi de todos, o de maior qualidade. 

    Frente ao que foi segundo do seu lote, com 535 kg, animal de pouca força, que oscilou em investidas prontas e outras mais reservadas, resultou mais discreta a actuação, com a voluntariedade de António Telles a ter melhor resultado no quarto e quinto da ordem.

    Luís Rouxinol é toureiro no verdadeiro sentido da palavra e tem um entendimento do toiro como poucos. Teve pela frente dois toiros a pedirem ofício, cada um com as suas ‘queixas’, e ele a contrariá-las com duas actuações de quem realmente sabe de toureio. O que foi segundo da ordem, um toiro com 574 kg, sério e com trapio, saiu a raspar muito e era tardo nas investidas. Rouxinol cravou-lhe três bons compridos e nos curtos, a espectacularidade e plasticidade do Douro, taparam as carências que houvessem do toiro, levando-o a investir e a perseguir com raça nos ladeios, mantendo um toureio de muita ligação. Cravou três curtos de boa nota, sendo o primeiro a sesgo e o palmito com que encerrou função, os de inequívoca correcção.


    Mas se Rouxinol já tinha agradado no primeiro, pessoalmente, foi no segundo do seu lote que me encheu as medidas. E não o fez sozinho… Quando o toiro saiu à praça, com 568 kg, bonito mas desinteressado, sem se fixar e a conter-se nas investidas, pensei “que fará ele agora?”. Rouxinol 'estudou-o' nos dois compridos que lhe cravou e depois, apareceu na arena com a estrela maior da sua quadra, a Viajante. A partir desse momento, até o toiro se terá sentido arrebatado pela égua e o seu comportamento mudou completamente. Arriscou o cavaleiro em citá-lo de largo, dando vantagens ao toiro, aguentando ele e a Viajante uma enormidade de tempo. O toiro arrancou-se alegre, com raça, com poder, e aí já não havia nada a fazer…grande ferro! Repetiu a proeza, e novamente o toiro com investida vibrante e o enorme coração do ginete e da montada a aguentarem, resultando um segundo ferro do outro mundo! Inesquecível! Mais em curto cravou um terceiro ferro de grande nota também. Não foi tão ajustado como os anteriores o quarto da ordem, depois de ter mudado os terrenos ao toiro, mas fechou em grande com mais um palmo de nível. Luís Rouxinol foi todo um senhor toureiro!

    Também Marcos Tenório teve passagem séria por Lisboa. O terceiro toiro da corrida, com 570 kg, harmonioso de apresentação, foi pronto e alegre de investidas, arrancando-se várias vezes aos cites de largo que o cavaleiro lhe provocou. Começou por recebe-lo à porta gaiola, e logo aí o levou em boa brega, para depois cravar três compridos de grande nota. Nos curtos, o cavaleiro manteve a intenção de lhe dar vantagens nas investidas, com abordagens mais rectas e outras abrindo mais o quarteio. Terminou com um par de bandarilhas naquela que foi uma actuação importante e correcta do cavaleiro de Elvas.


    O que encerrou a noite foi outro toiro de grandes condições, com 550 kg, em tipo do antigo ‘murteira’, animal nobre com classe no capote e prontidão nos cites, que contudo pouco se viu. Marcos também o esperou à porta gaiola, mas a reserva inicial da rês não permitiu grande brilho na brega. Nos compridos revelou a prontidão e a nobreza na investida, e o cavaleiro voltou a demonstrar eficácia na sua colocação. Nos curtos, e montando o Danone, quis mostrar-se em câmbios que acabaram por descompor a investida do toiro, levando-o para fora nos enganos com sortes menos ajustadas a alternarem com algumas passagens em falso. Voltou a rematar função com um par de bandarilhas.

    Nas pegas nem sempre foi fácil a noite, ou por culpa da fiereza dos toiros, ou porque nem sempre foram eficazes os elementos fardados. Ainda assim, tivemos dois Grupos a demonstrarem a verdade e a dureza do que é ser Forcado.


    Pelos Amadores de Santarém, abriu praça Lourenço Ribeiro que viu o toiro baixar-lhe a cara nas reuniões, tendo consumado à terceira com ajudas mas numa pega rija. António Góis sofreu forte derrote no seu intento, acabando por se lesionar e ser dobrado por Rúben Giovetty que efectivou com decisão. O cabo do centenário Grupo, João Grave, consumou à quarta e com ajudas carregadas, depois de três intentos com reuniões duras.


    Pelo Aposento da Moita, pegou Nuno Inácio que viu o seu toiro arrancar-se com muita pata, pisando-o e sendo violento na reunião, ficando lesionado e a ser dobrado por Miguel Fernandes que consumou bem e numa pega que resultou rija. O nóvel cabo do Grupo, José Maria Bettencourt efectivou à primeira uma pega tecnicamente perfeita, com o toiro a arrancar-se alegre ao cite e a consumar com decisão. Fechou a corrida, Ruben Serafim, com uma pega de boa execução, com eficácia do Grupo e à primeira tentativa.

    Dirigiu certeiramente e sem problemas, o sr. Rogério Jóia, assessorado pelo veterinário Dr. Jorge Moreira da Silva, numa corrida abrilhantada pela Banda do Samouco, em que houve ainda tempo para uma breve actuação do grupo musical Sangre Ibérico.

    Resultaram triunfadores dos prémios em disputa, Luís Rouxinol e o forcado José Maria Bettencourt (Ap. da Moita), numa noite em que o ganadero deu volta ao quarto e quinto toiro, quando a meu ver haveria outros toiros mais predispostos a conceder a volta ao seu dono, do que estes.

    E quando se juntam ‘alentejanos’, um espectáculo sério, com grandes lides e um ferro do outro mundo…a corrida resulta de muito interesse, com ritmo, ambiente, um nível artístico elevado, e felizmente, com honras de transmissão televisiva para que todos pudessem ter assistido.

    Venham mais destas…








    Por: Patrícia Sardinha