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    Despedida do Matador de toiros José Luis Gonçalves

    Campo Pequeno, 26 de Agosto de 2010


    Fotografia por:Pedro Batalha



    Crónica
    Por: Patrícia Sardinha

    Quando um toureiro se despede

    Numa das histórias que oiço desde pequenina, havia alguém que dizia a outro: “Amigo, você não se meta neste mundo dos toiros. Isto depois quando se quer sair, não se consegue. Mantenha-se só aficionado.”. Este conselho, é o reflexo de como o meio taurino pode ser viciante, controlado por um sentimento desmedido e poderoso, do qual depois de lhe tomado o gosto, dificilmente se poderá perder. Imaginem portanto, o que para um toureiro ou para um forcado, será ver chegar o dia em que terá que dizer ‘é o fim’, cortar a coleta, guardar a jaqueta… Praticamente será o mesmo que assumir que a idade já não o permite, ou que não se tem as plenas faculdades para se continuar em bom nível. É claro que continuarão os festivais, os tentaderos e os treinos no campo…mas aquela intensidade de uma temporada inteira, isso termina, mas só isso é que realmente tem fim, porque a alma de quem se põe diante de um toiro é sempre engrandecida e uma vez toureiro, toureiro toda a vida.

    José Luís Gonçalves despediu-se das arenas no passado dia 26 de Agosto no Campo Pequeno, mas jamais se poderá despedir da arte que suportou durante 28 anos, com mais ou menos intensidade, com mais ou menos reconhecimento. A praça contou com cerca de ½ casa, pouco para uma festa de despedida e menos ainda para um regresso, o do cavaleiro João Moura à principal praça do país depois de dois anos de ausência, fruto de mal-entendidos, condimentados por alguma imprensa dita especializada.

    Foi o cavaleiro de Monforte quem abriu a noite, frente a um toiro de Passanha com 530 kg, cómodo, muito ao jeito do que esta ganadaria nos tem habituado e que certos toureiros tanto gostam. João Moura teve assim uma primeira actuação onde se exibiu muito ao estilo do rejoneio, com ladeios, levando o toiro como quem leva um cão a passeio, mas que junto do actual público resulta muito bem. A ferragem, ainda que toda no sítio, resultou quase sempre de reuniões desajustadas. No seu segundo, da mesma ganadaria mas uma rês de outra estirpe, a pedir mais ofício, mais reservado e com 540 kg, Moura teve outra atitude. Ainda começou por voltar aos ladeios, mas entendeu que esse toiro não se predispunha a tal, sacou do Merlin e ainda que não tenha chegado tão facilmente ao público como a actuação anterior, foi uma lide de mais verdade, com o cavalo a ir recto e passo a passo, aguentando bastante e indo à cara do toiro para deixar a ferragem curta.

    O grupo do Aposento da Moita teve duas exibições muito similares, primeiro por José Maria Bettencourt que não se fechou bem no primeiro intento, mas a consumar ao segundo sem grandes complicações; e depois por Nuno Inácio, que na primeira tentativa não reuniu bem e na segunda, com grande destaque para o primeiro ajuda, aguentou-se e consumou.

    José Luís Gonçalves teve como primeiro do seu lote, um toiro de Falé Filipe com 518 kg, que, não sendo perfeito, serviu para lhe proporcionar um inicio de despedida em grande. Elegantíssimo com o capote, brindou a faena ao seu filho, que lhe segue as pisadas e ao seu amigo e alternante António Ferrera. Com a muleta foi bordando um toureio que poucos carregarão dentro, com a flanela a raspar lentamente a areia, levando o toiro confiado ainda que humilhando pouco e fazendo vibrar as bancadas. No seu segundo toiro, com 522 kg, voltou a estar sublime de capote e com a muleta teve que se impor mais, perante um animal mais contido, mas brusco e perigoso quando investia. Ainda assim, José Luís encontrou-lhe sítio, arrimou-se e saiu por cima.

    António Ferrera no seu primeiro toiro, com 524 kg, quis pôr alta a fasquia exibindo-se demasiado com o capote, recebendo a rês de rodillas e depois com navarras, ainda que nem sempre com sorte, deixando o toiro enganchar. Nas bandarilhas deixou o público rendido, com a espectacularidade com que crava e como é seu apanágio, mas na muleta apagou-se mais a chama, não entendeu bem o toiro e entre passes isolados foi tentando romper mas sem sucesso. Melhor sorte no seu segundo, com 530 kg, com quem cumpriu de capote sem grandes exibições. Nas bandarilhas fez o número, levantando as bancadas e com a muleta entregou-se para em passes redondos ir desenhando uma faena vibrante, daquelas que faz falta em Portugal para que o toureio a pé renasça. Um toureiro grande, uma Figura e ainda que para muitos discutível o seu valor, não se pode negar que Ferrera se entrega em cada praça como se todas fossem a maior praça do Mundo.

    E porque um toureiro não se faz só das atitudes na arena, mas principalmente nas atitudes da vida, mais ficou evidenciada a enormidade de Ferrera, quando no final da corrida, saca de José Luís Gonçalves em ombros e passeia-o pelo ruedo numa emotiva despedida do matador de toiros português, levando-o inclusive a sair pela Porta Grande. Quantas outras ‘figuras’ estariam dispostas a colocar em ombros outro toureiro?

    Dirigiu sem problemas o sr. Manuel Jacinto, assessorado pelo Dr. Patacho de Matos numa noite em que se despediu um toureiro das arenas, mas não se despediu jamais o Homem do toureiro e portanto José Luís Gonçalves continuará sempre a ser um caso de Rectidão, Simplicidade e Arte! Pena que neste Portugal dos pequeninos, escasseiem sempre os apoios a quem tem valor para os elevar mais alto e que só nos dias ‘das despedidas’ se lembrem de lhes dar oportunidades e de os glorificar. Va por si, maestro!


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    Por Pedro Rodelo (Cortesia Banda do Samouco)